A colônia italiana de Taubaté deu vida, cor e tempero para a antiga Capital do Vale. O prefeito Ortiz Junior (PSDB) assinou no início de fevereiro desse ano eleitoral a ordem de serviço para o início das obras de revitalização do distrito de Quiririm. Pela bagatela de cerca de R$ 3 milhões serão revitalizados a rua Coronel José Benedito Marcondes de Mattos, o novo palco e instalação de equipamentos urbanos, a praça Antonio Naldi e a reforma do mirante.

Toda essa pajelança administrativa será bancada com recursos do FID (Fundo Estadual de Defesa dos Interesses Difusos) da secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania do Estado. Portanto, não são recursos próprios da Prefeitura. Leia após a entrevista o que é o FID.

Revitalização?

CONTATO entrevistou Maria Aparecida Valério, a Preta Valério, presidente da Associação Cultural Quiririm, Preta Valério, uma das organizadoras da 27ª Festa da Colônia Italiana do Distrito em 2016.

Preta reside na casa da família Angelo Valério construída entre os anos de 1910 e 1915 para abrigar a grande família Angelo. Ele e dona Jesuína ali criaram aqui seus 11 filhos. Preta Valério é neta de Angelo e Jesuína. Seguem os melhores momentos de sua entrevista exclusiva a Paulo de Tarso Venceslau e Nathalia de Oliveira.

Preta Valério em entrevista exclusiva para CONTATO

Jornal CONTATO: Preta, por favor, se apresente.

Preta Valério: Meu nome é Maria Aparecida Valério. Minha irmã mais velha Patrícia, branca, e o meu irmão caçula com aparência de alemão com os olhos verdes e cabelo loiro. E eu, a mais moreninha, sou Preta desde que me conheço por gente. Por incrível que pareça. Nascida e criada em Quiririm há 49 anos.

JC: Qual o problema de Quiririm?

VP: Quiririm ficou segregado por quase 100 anos. Taubaté não dava bola pra nós e nem nós para eles. Então, somos uma casta até hoje na verdade, né? Pra você entrar não é tão fácil assim. Acho que isso que manteve nossas tradições.

JC: E a revitalização?

PV: [A Prefeitura] não consultou [os moradores] quase nada [sobre a revitalização]. Na verdade, eu fui a umas três reuniões com algumas pessoas aqui de Quiririm, ainda na época o Dennis [Diniz então secretário de Planejamento], era muito blá-blá-blá e pouca solução. Na verdade, esse projeto tem uns 10 anos ou mais.

JC: A Preta Valério é contra a revitalização?

PV: Não sou contra a revitalização de forma alguma porque pior do que estava não vai ficar. Quiririm era pobre, feio, aliás, ainda é. Mas a minha briga era por conta da Festa [da Colônia Italiana], por não encaixarem a Festa na revitalização porque a revitalização só veio por conta da Festa. Sem a famosa Festa Italiana estaríamos abandonados aqui até hoje. Quem é que iria se preocupar com revitalização de Quiririm?

JC: Mas o que rolava?

PV: Eu ia nessas reuniões [convocadas pela Prefeitura] pra saber como é que se encaixava a festa nessa história. E eles teriam que conversar primeiro comigo, né? Por que eu é que sei o mapa da festa, onde é que ficam as barracas, que dificuldade eu teria para colocar a festa na rua, o tamanho das barracas, não é verdade? Pra encaixar, né? Mas enfim, era só blá-blá-blá e bate boca e nada se resolvia. Fiquei três anos ouvindo histórias. E não seria no quarto que iria acontecer.

JC: Mas aconteceu…

PV: Em dezembro de 2015 não tinha nada. Pensei: o Júnior não vai ser louco de começar a revitalização 3 meses antes da Festa. Como é que eu iria fazer a festa? Rapaz, pro meu susto, em meados de março, um dia saindo daqui de casa e indo pra Caçapava trabalhar, faltando um mês e maio pra festa, passei na Rua do Meio e quando cheguei ali no palco estava cheio de máquina imensas e um pessoal botando tapume. Fechando ali a área do palco. Isso foi uns 15 dias depois do Carnaval porque a tenda estava lá ainda. Passei reto, mas não aguentei. Voltei.

JC: Voltou porque?

PV: Por que não aguentei. Lá tinha dois engravatados que eu não sei quem eram numa caminhonete enorme, mais um Fiat uno e 4 homens trabalhando. Fui direto aos engravatados, que não são daqui, acho que eram da empreiteira, me apresentei como presidente da Associação Cultural e perguntei o que estava acontecendo ali. Um deles virou e falou assim: “Ué, é a revitalização. O povo aqui não tá sabendo?”. E eu respondi que ninguém em Quiririm estava sabendo. E eu perguntei se ele estava sabendo da Festa que iria acontecer e eles não tinham conhecimento algum.

Um caixão de defunto ou banco em frente a casa da Família Magalhães Bastos

JC: Não sabia de nada?

PV: O cara é de fora. Eu perguntei qual o tempo de quebração na rua e ele disse que duraria oito meses. A festa aconteceria dali um mês e meio, cerca de 400 mil pessoas passariam por aqui. Ele disse que não tinha conhecimento, mas que iria se informar. Soube depois que ele foi na Prefeitura para saber do que se tratava isso e que foi um fuá porque a empreiteira não sabia de nada. Se eu não tivesse gritado não sei o que teria acontecido.

JC: Terminou?

PV: Pra festa ele terminou o quarteirão e tirou todo o tapume do palco. Alias, vai quebrar todo o palco também e vai fazer outro. E agora, depois disso tudo, tem a história desses túmulos ai na frente. E o povo tá reclamando muito porque é um troço muito feio. E você não consegue entrar em contato com ninguém. Botaram ainda três metros de calçada do meu lado e com isso diminuíram muito a faixa de rolamento. Aqui sempre foi mão dupla e sempre pode parar de um lado só. Questionei como ficaria o trânsito e a resposta foi que ele nem sabe de trânsito. Quem vai decidir é a tal da Lola depois que o troço tiver pronto.

JC: Como fica?

PV: É um monte de coisa jogada. Eles não fizeram um pré-estudo pra analisar a situação. A nossa questão agora é essa. Hoje o que acontece nos finais de semana é que o trânsito fica uma zona. Continua mão dupla sem poder estacionar, ou seja, tem motorista que anda pela calçada de três metros porque não cabem três carros se estiver um estacionado. Isso que o prefeito falou [que o trânsito só será pensado depois das obras] está gravado.

JC: Quem ganha e quem perde?

PV: Na verdade, Quiririm tem muito a oferecer a Taubaté e nenhum prefeito até hoje teve uma visão a respeito disso. A única porta de entrada para o turismo efetivo de Taubaté é Quiririm. E com muito pouco eles poderiam melhorar isso.

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FID

O FID (Fundo Estadual de Defesa dos Interesses Difusos) é mantido por ações civis públicas e seus recursos são destinados ao ressarcimento, à coletividade, dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, no âmbito do território do Estado de São Paulo.

Consideram-se Direitos Difusos os que não pertencem a grupos específicos ou a uma pessoa, mas a toda sociedade. Como por exemplo, o direito ao patrimônio histórico cultural e a sua preservação, ao meio ambiente saudável, às boas práticas comerciais e à repressão das práticas abusivas, dentre outros.

Imagens do projeto e da realidade

Projeto do banco que mais parece uma caixão de defunto abaixo

A fantasia do projeto se choca com a realidade

Projeto que não tem nada a ver com a realidade, mesmo que em obras