“Mulher cantadeira, vais de campina em campina em busca da mais serena; mulher modinheira, a cada noite teu cantar mais resplandece; pianista, formosa em teu ofício, braços abertos ao luar de sertões e metrópoles, tu segues. Mulher, a cada noite buscas róseas flores que só te surgirão aos primeiros raios da alvorada.”

Assim eu iniciei meu comentário sobre Modinhas e Chorinhos Eternos, à época (2009) o terceiro CD da pianista, flautista, compositora e arranjadora Eliane Salek.

O que mais me cativa em sua trajetória é a sua máxima aplicação de seus atributos (tantos) na diversidade de cada trabalho lançado. Cada um correspondendo a uma vertente da música brasileira: modinha e chorinhos em 2009; e repertório autoral (quatro composições) e clássicos de Jacob do Bandolim, Nelson Sargento, Tom Jobim, Vinícius de Moraes, Billy Blanco e Ernesto Nazareth em 2016, no seu quarto CD: Eliane Salek – 40 anos de palco (Fina Flor). A produção e todos os arranjos são seus.

“Homenagem a Mestre Cartola” tem ótima participação de Nelson Sargento, autor desse tributo a um dos nossos maiores compositores. Entremeado por citações de doze títulos de músicas de Cartola, o samba tem levada cadenciada, cuja introdução cabe à flauta e ao bandolim. Na sequência, o bandolim está com o violão e com o pandeiro. Um inspirado intermezzo de sax ilustra o acerto da harmonia e da melodia. Eliane confirma seu talento de cantora, em apoio à voz de Nelson Sargento.

Em “Odeon” (Ernesto Nazareth e Vinícius de Moraes) a introdução coube ao piano. Num andamento dolente, o clássico de Nazareth segue devagarzinho e sempre. O canto de Salek é irrepreensível. Sua afinação, sua dicção, sua respiração são o seu tesouro. O arranjo abre brechas para mudar o conceito melódico e rítmico, e logo depois retoma o tradicional. Até ajuntar-se ao violino para um intermezzo, a flauta pontifica. Violino, violoncelo e flauta somam-se ao piano. Desdobrando o andamento (com o pandeiro segurando as pontas), logo o choro, agora arritmo, pinga um ponto final.

Em “Baião Pro Hermeto” (Eliane Salek), a poeira sobe. Flauta e sax solam a melodia. Arretado, o coro come. A bateria segura a pegada no pulso. O acordeom resfolega. E o instrumental puxa a diversidade da música brasileira.

“Valsa Triste” (Eliane Salek) tem apenas o piano de Salek. Um instrumental com melodia belíssima, dividida ora por violino e violão, ora por flauta e violoncelo. A faixa mais bonita do disco… meu Deus!

“O Compositor”, um sambão esperto de Billy Blanco, joga a voz de Salek em direção a outra face musical brasileira. Com direito a coro misto, o couro come bonitão, e, como em todas as outras, Salek dá carta e joga de mão.

Pego emprestado trecho de outro parágrafo da resenha de 2009, para com ele finalizar: “(…) teu nome se diz Eliane. Carregas na alma a música, nas mãos a beleza, na voz a criatividade do canto brasileiro. Eliane Salek, assim se diz todo o teu nome, mulher brasileira.”

 

Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4