As razões que podem ter levado Ortiz Júnior a não dar qualquer opinião a respeito do bate-boca entre Gilmar Mendes, ministro do STF e presidente do TSE, e Rodrigo Janot, Procurador-Geral da República, passam necessariamente pela forte semelhança que existe entre o que acontece em Brasília e o seu “rejulgamento”, que o “absolveu” através de uma aberração judicial

            Nossa reportagem bem que tentou. Mas o prefeito Ortiz Júnior (PSDB) fez ouvidos moucos de mercador. Recusou-se a dar qualquer opinião a respeito de um tema nacional exposto em todos os meios de comunicação. Um conflito interno de um poder. Justamente o Judiciário no qual Ortiz Jr, em tese, atua como advogado que diz ser.

Jacques Lacan, famoso psicanalista francês, talvez explique. Ele dizia com frequência sobre a importância de se saber fazer ouvidos moucos. Mouco, para quem não sabe, é um dos sinônimos para surdo. Para Lacan, essa postura pode ajudar em várias ocasiões e ser altamente benéfica. Afinal, fazer-se de surdo em determinados momentos impede de ouvir besteiras. E não se envolver com o que poderia ouvir.

Ortiz Júnior sabia e sabe que o tema lhe é indigesto. Seu silêncio, porém, me deixa à vontade para refletir sobre suas possíveis razões.

Lacan

Jacques Lacan, psicanalista

Taubaté é uma amostra perfeita da política nacional

Estatística é a ciência mais empregada nos estudos científicos que se utilizam de amostras aleatórias extraídas de um universo, no qual se deseja fazer um determinado estudo.

Um dos problemas da estatística é a estimativa de parâmetros que expliquem o comportamento do seu objeto de estudo.  Essa estimativa é feita através de uma amostra, uma pequena parte do universo estudado. Trata-se de um método muito empregado em pesquisas eleitorais. Através da consulta de uma parte da população se pode inferir o resultado final das urnas. Se a amostra for feita através de requisitos técnicos, o resultado final dificilmente será diferente do obtido nas urnas.

A terra de Lobato, em minha opinião, é uma amostra perfeita da vida política nacional. Os fatos locais refletem exatamente o humor e as decisões de Brasília. A recusa do prefeito de comentar o que se passa nas cortes jurídicas reforça essa hipótese, mais uma vez.

Amostra

Taubaté é uma amostra consistente de Brasília

Brasília é aqui

Ortiz Júnior sabe muito bem o que acontece em Brasília. Ele conhece muito bem os protagonistas, como eles agem e como decidem. Sua situação razoavelmente confortável, hoje, é resultado se uma química jurídico/política empregada para resolver “impasses” eleitorais como esse, principalmente.

Os protagonistas são os mesmos. Minto. São quase os mesmos. Mas representam no mesmo palco. No caso, o Tribunal Superior Eleitoral. Ortiz Júnior conhece a linguagem e os métodos empregados através de advogados com livre trânsito na capital federal. E sabe mais ainda quanta reza lhe custou navegar por essas águas turvas em busca de um porto seguro. “(…) a grande realização dessa reparação da injustiça é a realização do milagre de Deus. Não tenho dúvida porque foi muita fé”, afirmou o prefeito em sua primeira entrevista coletiva após ser “absolvido” no TSE. Deve estar pagando promessas até hoje.

O regente foi Gilmar Mendes, ministro do STF e presidente do TSE, que ouviu as preces e promessas do prefeito. Foi secundado por Napoleão Nunes Maia Filho, que acabara de assumir a cadeira daquela corte até então ocupada pela ministra Maria Thereza de Assis Moura. Maia alinhou-se com Mendes, defensor de Ortiz Júnior, que antecipou seu voto, mesmo sendo presidente daquela corte, onde só votaria como voto de Minerva se houvesse empate na votação.

 

Santa ceia Nani

Qual deles poderia ser confundido com Gilmar Mendes?

Se correr, o bicho…

Ontem, quinta-feira (30), o presidente Michel Temer nomeou o advogado Admar Gonzaga para o posto de ministro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). O jornal Folha de São Paulo de hoje destaca que o novo ministro “rechaça ter vínculo com o presidente, que poderá depender de seu voto para continuar no poder”.

O filme se repete. Edmar Maia poderá desempenhar nesse julgamento o mesmo papel desempenhado por seu colega Napoleão no “rejulgamento” de Ortiz Júnior em outubro do ano passado.

Ministro Admar Gonzaga

           Admar Gonzaga, novo ministro do TSE, escolhido a dedo por Temer

                 Conhecedor dessa liturgia nada republicana, o prefeito preferiu fazer ouvidos de mouco quando convidado para opinar a respeito do embate travado pelo Procurador-Geral da República contra o ministro Gilmar Mendes, que não esconde seu viés tucano. Se Ortiz Júnior acompanhasse as opiniões expressadas pelas lideranças empresariais e políticas consultadas pela nossa reportagem (ver AQUI), com certeza ele poderia se indispor com principal aliado no seu “rejulgamento”. Caso contrário, revelaria seu alinhamento com o mestre Gilmar Mendes, hoje uma figura desgastada nacionalmente.

Afinal, ainda soa em meus ouvidos a resposta de Rodrigo Janot ao ministro Gilmar Mendes, sem nomeá-lo, quando afirmou que “alguns tentam nivelar a todos à sua decrepitude moral, e para isso acusam-nos de condutas que lhes são próprias, socorrendo-se não raras vezes da aparente intangibilidade proporcionada pela posição que ocupam no Estado”.

Janot e Gilmar

Janot e Gilmar em reveladora briga digna de botequim

             Ainda segundo Janot, a acusação de ter dado uma entrevista coletiva em off (confidencial) só pode vir de “mentes ociosas e dadas a devaneios” e ao “servilismo”. “Procuramos nos distanciar dos banquetes palacianos. Fugimos dos círculos de comensais que cortejam desavergonhadamente o poder político. E repudiamos a relação promíscua com a imprensa”, declarou o procurador-geral.

Talvez essas sejam as razões que explicam e até justificam os ouvidos moucos do nosso prefeito.