Prefeito furou a fila e pagou licença-prêmio para sua madrasta Odila Sanches, diretora de Finanças da Prefeitura, justificou não ter sido consultado e que o Ministério Público teria anuído com a determinação voluntária de forma de pagamento; e nada fez para coibir ou punir a iniciativa da funcionária

          Prefeito Ortiz Júnior afirma que não sabe o que, quanto e porquê foi realizado o pagamento pela Prefeitura, no valor de R$ 58.775,55 à sua madrasta que pilota a diretoria de Finanças municipal, assim como não sabia que essa decisão a colocava à frente de outros 1.308 colegas que estavam na fila para receber a mesma licença-prêmio. Um escárnio público!

Versão do prefeito

No dia 16 de maio o prefeito concedeu uma entrevista à TV Câmara. No final do terceiro bloco, ele afirma que sua madrasta e diretora de Finanças de Taubaté, Odila Sanches, “se apertou no final do mestrado” e por isso não conseguiu cumprir o acordo firmado no ano passado para a devolução dos R$ 58.775,55 recebidos após furar 1.308 servidores na fila da licença-prêmio.

Justificou afirmando que nunca houve regra para realizar o pagamento de forma cronológica. “Isso é intuitivo”, segundo o prefeito que afirmou que esse prêmio não era pago desde 2002 e que desde 2013 (primeiro ano de seu primeiro mandato) ter-se-ia organizado de forma “intuitiva”.

Ortiz Jr

Lágrimas de crocodilo pela “absolvição” com ajuda do ministro Gilmar Mendes 

Flagrada com a denúncia feita pelo sindicato dos funcionários e pela Gazeta de Taubaté sobre o autopagamento “sem minha (sua) autorização” (Ortiz Jr), Odila propôs o pagamento por “determinação voluntária”. “No ano passado, após o caso ser revelado pelo jornal, o governo Ortiz anunciou que Odila devolveria o valor em 12 parcelas, sendo 11 de R$ 5.000 (entre abril de 2017 e fevereiro de 2018) e a última de R$ 3.775,55 (em março de 2018).

Foi esse argumento usado pelo promotor público José Carlos Sampaio.

Acontece que até agora, segundo o enteado de Odila, “já teriam sido pago cerca de 40 % da dívida”.

Segundo o prefeito, o pagamento integral não teria sido integral porque Odila apresentava saldo negativo no banco que imediatamente teria resgatado a dívida. O tempo passou e ela ainda não pagou.

JC Sampaio

Se o promotor Sampaio assistir entrevista do prefeito poderá rever sua decisão

Pagar que é bom…

Acontece que até agora o pagamento limitou-se a 40 % do valor total, segundo o próprio prefeito. E justifica que no “final de quitação de mestrado, ela diminuiu um pouco as parcelas. Mas ela mesma alega que vai fazer parcelas maiores completando o valor que ela mesma se dispôs a pagar”.

Mas não justificou a razão de ter reduzido o pagamento das parcelas a R$ 2.500,00 e até R$ 500,00 por mês. Se o prefeito fosse funcionário de algum estabelecimento bancário e fizesse um negócio como esse teria sido imediatamente demitido. Um caso típico desvio de função que ocorre na prefeitura pelo menos desde 2013. O mais visível foi a “compra” do imóvel onde funcionava a Resolução Gráfica, na rua dr Emílio Winther, que permaneceu fechado até o final do primeiro mandato. Um “negócio” mais pertinente ao mercado imobiliário do que à Prefeitura..

Apesar da divulgação por parte do jornal CONTATO, desconheço qualquer iniciativa por parte do Ministério Público a respeito desse “negócio” que só foi inaugurado como Centro de Formação de Professores cinco anos depois, no início de fevereiro de 2018.

Antiga Resolucao

Por que móvel comprado em 2013, só foi inaugurado em fevereiro de 2018?

Qualquer funcionário que fizesse o que Odila fez teria sido punido. Ela recebe salário bruto de R$ 21.581,98. A devolução das parcelas de R$ 5.000,00 deveria ocorrer no último dia útil de cada mês, o que foi feito em abril e maio de 2017. Porém, em junho, a diretora de Finanças não efetuou o depósito e pediu para as parcelas serem reduzidas para R$ 2.500. Em julho, ela fez dois depósitos de R$ 2.500 referentes a junho e julho.

Só então aparecem as “justificativas de ordem pessoal”, que o prefeito deixou escapar na entrevista que seriam problemas financeiros de suas filhas, sem maiores esclarecimentos. Esse argumento justificou a solicitação para que as parcelas fossem reduzidas para R$ 500 mensais, imediatamente concedido pelo prefeito.

Odila é casada com o ex-prefeito Bernardo Ortiz, dono de um invejável patrimônio, que poderia perfeitamente financiar essa dívida pessoal de sua esposa. Mesmo com todo esse apoio – marido e enteado -, ela não realizou no prazo os pagamentos referentes a setembro, novembro e dezembro de 2017, e fevereiro de 2018. O acumulado de R$ 2.000,00 só foi pago no dia 20 de abril desse ano, quatro dias após a oposição protocolar requerimento na Câmara para questionar o cumprimento do cronograma inicial. Nesse ritmo, a dívida só será quitada em dezembro de 2024. Um negócio de mãe para filho que não levou em conta o juro cobrado pelo sistema financeiro.

Ministério Público

Diante da afirmação do prefeito que teria recebido anuência do Ministério Público para executar esse negócio com sua madrasta, procurei o promotor José Carlos Sampaio que se limitou a enviar a Promoção de Arquivamento, de sua autoria, ao Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo (CSMP) e a decisão do referido Conselho baseada na sua argumentação.

O que diz Sampaio

Em 05 de junho de 2017, Sampaio afirma, entre outras coisas: “Após o recebimento de representação formulada pela vereadora Loreny Mayara Caetano, noticiando suposto favorecimento pessoal no pagamento de licença-prêmio e a possível prática de nepotismo envolvendo a servidora Odila Maria Sanches [que] valeu-se do cargo de Diretora de Finanças para autorizar o pagamento de licença-prêmio, em benefício próprio e descumprindo ordem cronológica de pagamentos”.

“O Prefeito Municipal de Taubaté prestou informações e encaminhou cópia do [respectivo] processo administrativo”. Observa que “não há fundamento jurídico para censurar o direito da servidora Odila Sanches receber licença-prêmio […] [cuja] situação difere da que atina aos servidores da Câmara Municipal” […] “na época não havia norma municipal que determinasse o pagamento em ordem cronológica […] De qualquer forma, verifica-se que foi adequado o motivo externado pela Administração para excepcionar o costume administrativo de efetuar o pagamento em ordem cronológica […] incorporado como art. 1º, § 6º da LCM 001/2017”. E salienta que “a servidora vem restituindo aos cofres públicos os valores recebidos […]

O promotor afirma que Odila “foi nomeada para o cargo de diretor, mas exerce funções de natureza essencialmente política” e que se subordina “apenas ao prefeito” […] e que “nas duas questões suscitadas pela representante (vereadora Loreny) – licença-prêmio e nepotismo, não se vislumbra ofensa a qualquer direito difuso ou coletivo que possa dar ensejo a uma obrigatória atuação ministerial. Se eventualmente houve ofensa à ética, o fato encontrou na própria seara administrativa o seu devido remédio: a determinação do Prefeito Municipal para que houvesse a devolução do montante recebido pela servidora Odila a título de licença-prêmio”.

Conclui pela “promoção do arquivamento” e sua remessa ao CSMP. Este, por sua vez, no dia 03 de outubro de 2017 homologa a promoção de arquivamento solicitado pelo procurador José Carlos Sampaio.

Providências necessárias

O depoimento do prefeito Ortiz Júnior (PSDB) lança novas luzes a esse imbróglio que o promotor considera encerrado: 1) a dívida ainda não foi paga; 2) ao que se sabe, nenhuma providência foi tomada; 3) o nepotismo mencionado na representação da vereadora Loreny (PPS) ao promotor Sampaio.

A bola volta para o Ministério Público e seu Conselho Superior para reavaliarem se foi justa a decisão tomada nas hipóteses bem-intencionadas do promotor José Carlos Sampaio.