Na intensa semana do impeachment na Câmara dos Deputados, muitos políticos, à esquerda e à direita, usaram os livros de história como escada para seus discursos. Como as próximas gerações verão o processo? Foi um golpe ou movimento democrático e popular, como aquele que derrubou Fernando Collor? Você estava do lado certo?

As respostas ao exercício de futurologia variam dependendo do interlocutor, mas uma coisa é certa: o ator Alexandre Frota escreveu seu nome na narrativa do impedimento, e isso é, no mínimo, inquietante.

Eu estava no Salão Verde da Câmara quando o ator pornô, que foi investigado por envolvimento com uma quadrilha de traficantes em 2005, chegou ao local acompanhado do deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) e seu filho, Eduardo Bolsonaro (PSC-SP).

O trio se dirigiu imediatamente ao púlpito onde ocorrem as entrevistas coletivas. Formou-se então uma roda concorrida de câmeras e gravadores. Todos atentos para ver o que o “ativista” tinha a dizer.

— Saibam que nós brasileiros não vamos desistir em acabar com esse governo safado e vagabundo de Dilma. Vou entregar essa peça ao meu malvado favorito, Eduardo Cunha — disse Frota.

No momento que o Congresso avaliava a admissibilidade do pedido de impeachment assinado por Miguel Reale Jr, Janaína Paschoal e Hélio Bicudo, o ator Alexandre Frota, que integra a cúpula do grupo Revoltados Online, apresentou o 36° pedido de impeachment de Dilma.

Alexandre Frota com Jair Bolsonaro em foto divulgada em redes sociais em 2015

Alexandre Frota com Jair Bolsonaro em foto divulgada em redes sociais em 2015

Em seguida, dirigiu-se ao gabinete da Presidência da Câmara e foi recebido por Cunha como se fosse o líder de alguém ou de alguma coisa. Eu já tinha visto Frota em manifestações e suas intervenções causavam constrangimento até entre os intervencionistas mais exaltados.

Em sua busca incansável por algum espaço na mídia, o ator do Revoltados Online voltou a ser notícia essa semana ao entrar na polêmica sobre a cusparada do ator José de Abreu. “Tô louco pra encontrar contigo, irmão”, declarou. “Eu vou dar minha cara pra você cuspir, Zé, e eu duvido você cuspir”, disse ele um vídeo postado na internet.

O que exatamente ele quis dizer com isso? Será uma ameaça? Não, é tudo factoide mesmo. E o objetivo é surfar na onda de “indignação” contra o ator global.

Deputados Jair Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro em entrevista à Agência Congresso, no Salão Verde da Câmara

Deputados Jair Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro em entrevista à Agência Congresso

Goste-se ou não do José de Abreu (que tem 70 anos) o fato é que ele foi covardemente atacado por um jovem reacionário enquanto jantava com sua esposa. Reagiu com uma cusparada. E você, faria o que? Essa abordagem foi transformada em “estratégia de luta” pelos militantes de direita, mas não é. E pelo menos nesse caso eu não tenho dúvidas sobre o julgamento da história.

Recentemente, o Movimento Endireita Brasil deixou claro como a coisa funciona e ofereceu, em mensagem postada nas redes sociais, um pagamento de R$ 1.000,00 para quem hostilizasse o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) enquanto ele jantava em restaurante de São Paulo.

Quando a mensagem começou a circular, Ciro Gomes foi alertado por assessores, mas permaneceu no local e tirou onda. Seu filho, que estava à mesa, gravou um vídeo provocando o ex-ministro e pedindo a recompensa.

A colunista Sonia Racy revelou nessa terça-feira, 26, que o Eduardo Cunha foi jantar no restaurante Gero, no Rio, e instalou-se um “silêncio sepulcral”. Ou seja: nenhum indignado ligou o celular e o atacou.

Depois que Michel Temer assumir o poder, o entusiasmo patriótico do impeachment deve diminuir. Vida que segue.  Só então será possível aferir o tamanho real do núcleo ultrarreacionário que atuou no movimento “Fora Dilma”.

O desempenho de Jair Bolsonaro nas pesquisas de opinião para a disputa presidencial é uma pista.

Por Pedro Venceslau, veja o “melhor do trocadalho do carilho” em www.blogdovenceslau.blogspot.com