Aroeira retrata Bolsonaro

Costumo ser muito respeitoso com os animais e por isto, de saída, peço desculpas aos bichos. E fico imaginando sob a ótica dos estereótipos qual deles corresponderia ao ex capitão, agora em exercício na presidência. Apoio esta minha audácia em pareceres firmados sobre a tentativa (felizmente) frustrada de dois soldados delinquentes, um deles Jair Bolsonaro, arriscando explodir reservas do Exército Nacional, mediante a reivindicação de aumento de soldos. Recupero, pois duas afirmações que valem como pressupostos para minhas aproximações entre o presidente e certos animais. Começo pelo dizer do general Geisel garantindo que Bolsonaro era “mau soldado”, e emendo na decisão firmada no processo que levou um dos rebelados, o ex capitão, a processo relatado pelo coronel Carlos Alfredo Pellegrino. Em ato conclusivo sobre a averiguação judicial – que resultou no afastamento de Bolsonaro da linhagem militar – o relator do processo, frente à defesa do terrorista, se manifestou enfatizando tratar-se de “falta de lógica, racionalidade e equilíbrio na apresentação de seus argumentos” e pontificou garantindo ser aquele ato característico de alguém com “grave desvio de personalidade”. Pronto, girada a chave dada por Geisel e Pellegrino, imaginemos um passeio pelo zoológico em busca do animal representativo de nossa autoridade máxima.

O primeiro bicho identificado poderia ser um enorme elefante branco que ocupa um espaço apertado para sua capacidade; exemplar exótico na manada, ele se distingue pela falta de modos, de domínio expressivo, de equilíbrio mesmo. Poderia ser também um bode que não sabe se comportar em lugar colocado por equívoco e que, inadequado, quebra tudo a cada movimento. Em seguida, poder-se-ia pensar em um papagaio ou uma daquelas aves barulhentas que abusam da penugem verde e amarelo, batendo asas a cada vez que repete os mandamentos da extrema direita. Ah, poderia ser um macaco desses apalhaçados que imitam tudo que mandam fazer e que se comprazem com bananas jogadas por um certo Olavo, seu mentor. Talvez passasse por alguma serpente venenosa, dessas bem peçonhentas e que lhe servisse de corpo capaz de matar mais de 200 mil pessoas, vítimas de políticas negacionistas. Pensei em uma ema, mas resolvi poupá-las, pois aquelas que o bicaram nos jardins do Alvorada me representam e não mereceriam tanto castigo.

Supus depois uma anta, mas acho que também elas ficariam zangadas sendo rebaixadas em sua capacidade de discernimento. E os camaleões valeriam, me indaguei, mas logo achei que pela capacidade sutil de mudar de aparência não daria certo, Bolsonaro não tem a leveza de entendimento das alterações sutis e oportunas, ele só muda de acordo com as ordens vindas do exterior. O bicho preguiça poderia ser uma boa alternativa, pensei, pois ocupa lugar sem executar trabalho algum, e mais, além de não fazer nada útil vive com as garras enfiadas em árvores sólidas como se fossem as Forças Armadas. Dispensei os jacarés, pois o próprio ex capitão o elogiou dizendo-o alternativa para a transformação motivada pela vacina.

À medida em que deixava meu pensamento passeando pelas possibilidades, ocorriam novas alternativas, todas interessantes, mas tantas eram que optei por eliminar algumas como o portentoso leão, soberano, majestoso. Deixei de lado também os demais grandes felinos, porque são espertos, ágeis, donos de movimentos impensáveis no personagem em foco.

E por falar em foco, lembrei-me da foca e, confesso, demorei-me um pouco mais, pois os sons emitidos por ela me fizeram lembrar as reuniões feitas no cercadinho do Palácio onde outras focas aplaudem. Mas fui em frente e, não escapei de uma vaca e, sabe, apoiei essa alternativa supondo os beneficiados das rachadinhas que vazam benesses saídas das tetas ordenhadas pelo famigerado Queiroz. Daí para os coelhos foi um pulo só e nem justifiquei pela prole (01, 02, 03, 04 até ser barrado por uma menina, fruto de vacilo, pois identifiquei pela capacidade de multiplicar problemas de efeitos internacionais e consequências que afetam a China, os Estados Unidos, a Argentina, nossos parceiros maiores. Veado, deixei de lado, pois poderia ferir algum filho e a proposta seria desvirtuada.

Capivara se afigurou uma boa candidata porque é sempre inconveniente e capaz de incomodar muito e estar em lugares indevidos. Certos animais desengonçados poderiam incorporar o lamentável personagem presidencial, mas a girafa por exemplo foi dispensada não por suas pernas longas, mas pelo pescoço que a faz enxergar distancias, e esse não é o caso do ex capitão. Porco espinho ou gambá se afiguraram e ambos caberiam pelo fato de se defender de maneira agressiva a qualquer demanda, principalmente se for democrática.

Bem, a lista é grande e as aproximações variadas, mas por fim conclui por um animal que realmente me convenceu: o dragão de Komodo. Sei que é estranho, pois esse bicho horripilante não é espécie de zoológico mas, convenhamos, além de amedrontador, feroz, irracional, tem uma baba infecciosa capaz de aniquilar os desiguais. Há um fator a mais nessa escolha, pois a obsessão paterna pela prole o distingue fazendo da proteção dos filhos a virtude única do bicho pavoroso. Sabe o que mais me assusta e mete medo? Sendo o elo mais próximo dos dinossauros, o dragão de Komodo não tem predador capaz de detê-lo… Aí é que a coisa fica séria, se não o controlarmos, o mundo pode virar um zoológico. Impeachment já.