O ministro do STF, Dias Toffoli, anulou todas as provas do acordo de leniência da Odebrecht na Lava-Jato: decisão deve ter efeito cascata em réus e investigados

A decisão que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli tomou anteontem, suspendendo os pagamentos que a Odebrecht ainda tinha que fazer como parte do acordo de leniência com a Lava-Jato, começou a ser arquitetada lá atrás, em maio de 2023.

Na ocasião, Edson Fachin deixou a relatoria do caso Vaza-Jato antes da hora e o entregou direto para Toffoli, driblando o regimento da Corte e evitando a redistribuição do processo por sorteio — que poderia colocá-lo nas mãos de qualquer outro ministro.

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Desde então, o magistrado já deu uma série de decisões que supostamente se destinam a corrigir abusos e recolocar a tramitação dos casos sob o império da lei, mas, na prática, o efeito é o contrário.

Na mais marcante delas, tomada em setembro passado, Toffoli anulou as provas obtidas no acordo de leniência da Odebrecht em todas as esferas, para todas as ações.

Alegou que o processo fora maculado pela falta de acordos de colaboração internacional, mas eles não eram necessários, uma vez que planilhas de propina, extratos bancários, e-mails e registros de retirada de dinheiro foram fornecidos voluntariamente pela empreiteira.

Depois, afirmou que mensagens dos procuradores capturadas ilegalmente pelo hacker Walter Delgatti Netto sugerem que “há no mínimo dúvida razoável” sobre quão voluntários foram esses acordos.

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E atendendo aos pedidos da J&F, em dezembro, e agora da Odebrecht, concedeu a elas acesso aos diálogos e suspendeu os pagamentos até que se consiga analisar todo o material — o que ninguém sabe quando e se pode acontecer, já que Toffoli não estabeleceu nenhum prazo.

Com sua canetada desferida no último dia do recesso do Judiciário, o ministro do Supremo corroborou ainda uma pirueta jurídica: as empresas afirmam que fecharam seus acordos sob coerção, num flagrante atentado ao Estado de Direito, mas não pedem que eles sejam anulados.

Caso o fizessem, teriam a chance de acabar de vez com as multas — de R$ 10,3 bilhões para a J&F, e de R$ 3,8 bilhões no caso da Odebrecht. Mas perderiam também os benefícios de seus acordos — como a permissão para voltar a disputar obras públicas e receber empréstimos de bancos estatais, além da garantia de que não seriam mais processadas pelos crimes já confessados.

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Dessa forma, Toffoli colocou as empresas no melhor dos mundos: muito provavelmente não precisarão pagar mais nada, mas também não perdem os benefícios recebidos.

Quem deixa de ser compensado por anos de corrupção bilionária — que até agora nem essas empresas e nem Toffoli negaram ter existido — são o Estado e o contribuinte brasileiro.

As perdas tendem a aumentar, já que o ministro sinalizou claramente que deverá atender os pedidos similares.

A fila de empresas querendo se livrar de multas bilionárias é grande, e o valor que ainda falta pagar é ainda mais impressionante. Mas elas sabem que podem contar com Dias Toffoli e sua noção sui generis de proteção do Estado de Direito.