Espelhos (clique)

Por: José Carlos Sebe Bom Meihy

UMA COLÔMBIA PARA BRASILEIROS LEREM

Mestre JC Sebe registra sua emoção ao reencontrar um país marcado pela violência de guerrilheiros e narcotraficantes e que agora emite sinais vitais que anunciam uma nova época que lembra seus “jovens anos que buscavam na Colômbia o sonho de “nuestra América”


Estranho voltar a Bogotá depois de cerca de quarenta anos. Muito esdrúxulo este sentimento que mistura curiosidade, apreensão e ensinamentos. Lembro-me de ter visitado a polêmica capital da Colômbia quando ainda era jovem e, então, ansiava por conhecer os segredos da prometedora nuestra América.

A crença no futuro latino-americano compunha os mais belos sonhos daquele então jovem de vinte e poucos anos. Eram devaneios calibrados pela lógica de esquerda que animava corações esperançados, principalmente os de cunho revolucionário. O mundo haveria de ser melhor, mais justo, e tudo fazia crer re-começos a partir de nosso continente.

O tempo passou e junto com o trágico enredo de desventuras propôs para a Colômbia um espaço horrível de ameaças, lutas, surgimento de grupos guerrilheiros e envolvidos pelos “narcos”. Enfim, nada do que projetava como destino se lhe ocorreu.

Reverso disso, um lugar conturbado – talvez dos piores da América. Ali afloraram os cartéis que disseminaram a droga e com ela a Colômbia mostrou suas garras envenenadas, marca de um país que entranhava alguns dos piores bandidos. Não voltei mais à Colômbia até agora e aqui tenho que constatar que os colombianos conseguiram virar a página inglória de uma sociedade fadada ao inferno.

Um generoso convite para ministrar um breve curso na Universidade Nacional de Colombia me trouxe de volta. Certo de que a maior virtude dos colombianos jamais estaria perdida, a cortesia de ex-alunos me arrebatou e fez inevitável a aceitação. Logo fui avisado de que deveria me preparar para as famosas “revisas”, ou seja, revistas que implicam abrir as pastas, deixar ver os bolsos.

Desde que cheguei, ainda no aeroporto, depois da saída da imigração, fui convidado a mostrar tudo o que tinha. Fiz com boa vontade, mas apreensão. Afinal, que significaria aquilo? Tudo ficou mais fácil quando vi muitas pessoas, descontraidamente, cumprindo uma ordem que é fundamental para a recuperação da paz e combate às drogas. E com bom humor!

Logo também fui informado de que ao entrar no hotel, nova revisa seria efetuada e que todos passavam pelo mesmo processo. Verdade. Confesso que em poucos dias senti naturalidade nesse procedimento. Ao ver o resultado – a diminuição dos índices criminais, a coesão popular em um projeto de recuperação social de vida – aderi com entusiasmo. Passei a prestar mais atenção a tudo. Foi importante, por exemplo, notar que aqui não mais há imunidades parlamentares e que todos – até o presidente – passam pelos mesmos critérios de julgamento.

Além da alegria de ver um país empenhado na busca do progresso, vivo uma Colômbia que celebra os 80 anos de Gabriel Garcia Marques e os 40 anos da publicação do formidável “Cem anos de solidão”.
Ontem, fui ao Estádio Nacional assistir ao jogo da seleção do Paraguai X Colômbia. Foi um espetáculo. Pude entender na alegria da torcida o convívio com um programa de educação geral tendo em vista o estabelecimento de uma nova etapa nacional. O controle da violência conjugado com a perseguição aos cartéis de drogas faz com que seja possível sonhar hoje com a matéria idílica de meus jovens anos que buscavam na Colômbia o sonho de “nuestra América”.



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