Por: José Carlos Sebe Bom Meihy
302 FELIZ ANO NOVÍSSIMO...
Saturado
com a exploração mercadológica das mensagens
que anunciam um novo ano, mestre JC Sebe propõe uma reflexão
para que possamos nos reencontrar com o sentido mais profundo de
um sincero desejo.

Parece
que simplesmente enunciar “feliz ano novo” não
mais é garantia de legitimidade afetiva, de votos
calorosos, dirigidos à passagem de um ano para outro.
Em mensagens festivas, cartazes pendurados em lojas, panfletos
comerciais, jornais, em todos os cantos, a expressão
está mecanicamente expressa e nem a lemos mais. Virou
merchandising e basta bater os olhos para passarmos reto.
A fórmula se gastou, esvaziou-se, perdeu sentido.
E, sejamos sinceros, ficou até chata. O que fazer
então? Duas alternativas despontam: abandoná-la
para no lugar deixar um silêncio cúmplice,
mas verdadeiro, ou recarregar a proposta de sentido usando
superlativos. Mas aí se abre outra polêmica:
dilatar “felicíssimo” em vez de “feliz”
ou “novíssimo” substituindo “novo”?
É lógico que sou daqueles que acreditam no
olhar comprometido, na sinceridade contida no silêncio
pleno e na solidariedade que não precisa de palavras,
mas, na cadência das festas de fim de ano, acho que
é melhor apelar para as dimensões da palavra
enunciada, escrita ou oral, e exaltar a vibração
que ganha ênfase no exagero. Quem sabe então
emerge em bom tom a possibilidade dos votos que chamam a
atenção exatamente pela convocação
da grandiosidade? Mas então como ficaria: “Felicíssimo
Ano Novo” ou “Feliz Ano Novíssimo”?
A equação guarda algum enigma e exige posições:
uma ou outra. Tanto “novíssimo” como
“felicíssimo” são adjetivos, qualificativos
do substantivo “ano”, mas se olharmos bem são
diferentes em suas possibilidades.
Não acredito muito na felicidade dada. Ancoro minha
certeza na expressão cunhada por Ailin Aleixo em
uma crônica famosa intitulada “Só os
idiotas são felizes”, aliás, a primeira
frase desse texto é antológica “Idiotice
é vital para a felicidade”. A partir daí
a autora evoca o direito à futilidade como base do
ser feliz. E nos convida à tolice que deve ser trocada
pelo comprometimento que seria, afinal, o oposto da felicidade.
“Novíssimo”, por sua vez, comportaria
luta, superação, metas e caminhos a serem
traçados por serem “novos”. Como prezo
meus leitores, asseguro a opção pelo “novíssimo”
e assim livro-os de serem vazios, bobos e... felizes. E
de ter um “felicíssimo ano novo” como
continuidade de experiências transcorridas que afinal
devem ter sido infelizes. Aliás, desde Sêneca
(“Da vida feliz”), passando por Madame du Chatelet
(“Discurso sobre a felicidade”) até o
inefável Arthur Schopenhauer (“A arte de ser
feliz”), o que temos são receitas de felicidade
que nunca funcionaram e que reduzida à frase mais
usada no final do ano apenas ratifica seu conteúdo
gasto. O que busco é “novíssimo”
e pode vir no ano que entra a depender de empenhos.
Com “ano novíssimo”, pois a história
é outra. No novo reside a esperança que se
elevada à potência máxima abre um céu
de oportunidades. Então o “feliz” ou
“felicíssimo” fica reduzido a uma introdução
e transforma-se, no máximo, em preparação
para o que há de vir que, por sua vez, sugere um
calendário inédito, de lutas e conquistas.
E o “novíssimo” pode sugerir um tempo
de experimentações. Se o “novo”
admite começos, “novíssimo” é
mais alvissareiro por conter promessas enormes, por nos
deixar o sonho de poder então reinventar um tempo
onde se permite: abraçar mais pessoas, ser mais amigo
e solidário, comprometer-se com a paz e com o equilíbrio
ecológico do Planeta, com a conciliação,
ser mais atento ao trabalho conseqüente e fazer melhor
o que se propuser. E manter o espírito “novíssimo”
em tudo isso é algo que exige superação
de uma felicidade sempre anunciada, mas nunca vivificada.
Meus caros leitores, amigos queridos, desejo a todos um
“Ano Novíssimo”. Vamos começar
tudo outra vez e responder ao final se o Ano Novíssimo
foi talhado à imagem e semelhança do que plantamos
hoje.
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Jornal Contato 2006 |