Nem tudo que reluz....
O circo faz parte da vida legislativa do país. Quiçá, em todas as partes do planeta onde prevalece a democracia. Um único senão. O espetáculo pode esconder a verdade da racionalidade do cidadão que apenas tem acesso às cenas teatrais. Na quinta-feira 19, foram horas de debate teatral. Afinal, o que se debatia? O que é o Programa ReLuz? Quem ganha e quem perde?

Por Paulo de Tarso Venceslau


Bate boca e ameacas na primeira votacao do Reluz

       Circo armado. Claque especialmente contratada para fazer papel de figurantes na TV Câmara; discursos recheados de lugares comuns sobre a redenção de Taubaté, obtida graças ao Programa ReLuz; generosidade triunfante da maioria governista (obtida sabe-se lá como), que teve na figura da vereadora Pollyana (PPS) a face mais visível do fisiologismo; e uma oposição acuada e assustada com a nova e aparente correlação de forças no Legislativo. Tudo pronto, Carlos Peixoto (PMDB), um presidente consciente do seu papel na condução do trator a serviço do Palácio Bom Conselho, dá início aos trabalhos. ReLuz, câmera, AÇÃO.

Programa ReLuz

       Segundo a Eletrobrás, “o Programa Nacional de Iluminação Pública Eficiente - ReLuz tem o objetivo de promover o desenvolvimento de sistemas eficientes de iluminação pública, bem como a valorização noturna dos espaços públicos urbanos, contribuindo para melhorar as condições de segurança pública e a qualidade de vida nas cidades brasileiras”.
       Através da conservação de energia elétrica busca-se melhorar a eficiência energética nos sistemas de iluminação pública e ampliar os benefícios destes projetos a toda população urbana através de novas tecnologias. Portanto, ninguém pode ser contra um programa como esse, mesmo que seja, basicamente, voltado para as concessionárias de energia elétrica, responsáveis pela execução desse programa.
Segundo o governo federal, ele “será implementado pelas concessionárias de energia elétrica através de contratos com os municípios e, em complemento, a ELETROBRÁS poderá aplicar ações do PROCEL nos municípios que participarem do Programa, através de convênios de cooperação”. A iniciativa cabe às prefeituras. Os recursos a serem aportados para a implementação dos convênios com os municípios “virão da ELETROBRÁS com uma contrapartida das concessionárias, dos municípios ou de outros agentes envolvidos. Por estes convênios, a ELETROBRÁS/PROCEL colaborará com os municípios na concretização de um conjunto de medidas de estímulo ao uso eficiente e racional da energia elétrica..”
       Não há registro de qualquer vereador manifestando-se contra o Programa em si. Nem mesmo o petista Jéferson Campos, um dos mais oposicionistas, que sonha em ver o governo Lula fazer alguma coisa por Taubaté. Logo, o problema não é e nunca foi o programa ReLuz.

Cartas escondidas

       A grande questão era e é o papel da Bandeirante Energia nesse imbróglio. A Eletrobrás financia 75 % do custo total diretamente à concessionária que juntamente com a prefeitura assumem a responsabilidade pelo restante como “contrapartida [...] que poderá ser feita por meio de serviços próprios como: transporte, mão de obra e outros necessários a execução do projeto”, segundo o manual do ReLuz.
Porém, a Prefeitura não verá a cor desse dinheiro. Trata-se apenas de uma operação contábil porque a Eletrobrás pagará diretamente à Bandeirante de acordo com a execução do cronograma de obras. Obra realizada, dinheiro em caixa. Os 25 % restantes, que poderiam ser pagos com serviços próprios, serão transformados em dívida financeira da Prefeitura junto a Bandeirante. Curiosamente, nenhum vereador da oposição questionou esse fato.
       Segundo o consultor em energia René Vernice, a Bandeirante não costuma trabalhar dessa forma. Vernice não sabe explicar a razão que levou a concessionária a mudar seu padrão de procedimento no caso do Programa ReLuz para Taubaté.
       Os dados disponíveis apontam para algumas hipóteses. A primeira e mais visível é o fato que a Bandeirante, como intermediário financeiro, transferiu para a Prefeitura as suas despesas previstas pelo Programa Re Luz. Pelo menos é o que se deduz do item 3.2 das condições financeiras da própria Eletrobrás que diz sobre a comissão de reserva de crédito:
“a Concessionária pagará uma comissão de reserva de crédito de 1% (um por cento) ao ano, com vencimento mensal e paga no dia 30 (trinta) de cada mês, até o encerramento do crédito, calculada sobre o saldo não desembolsado do crédito, contada a partir da liberação da parcela de assinatura”.

 

 

 

 

       Ou seja, além de transferir para os cofres públicos uma responsabilidade sua, a Bandeirante acrescentou mais alguns juros para garantir um lucro financeiro que nada tem a ver com seu papel de concessionária de energia elétrica.
       Outro mistério. A concessionária receberá diretamente da Eletrobrás o pagamento pela execução de obras e serviços, de acordo com a execução do cronograma. A Prefeitura pagará à concessionária em 60 suaves prestações os recursos da Eletrobrás colocados à sua disposição para executar as obras. E os 25% restante a Prefeitura poderá pagar com “serviços próprios”. Já que perguntar não ofende, porque então a concessionária foi apresentada como intermediária para receber uma vultosa comissão por um “trabalho” que não tem nada a ver com energia elétrica e muito menos com iluminação pública? Haveria, por acaso, acordos não revelados para garantir apoio material para candidatos nas eleições de 2008?
       Existem muitas cartas que não foram e nem serão trazidas à tona espontaneamente. Isso só acontecerá se despertar interesse por parte do Ministério Público Federal, uma vez que se trata de um projeto promovido por Brasília, com recursos federais. Aliás, o acompanhamento das contas dos candidatos em 2008 poderá ser uma boa pista.
       Uma coisa é certa: a Bandeirante jamais fará qualquer depósito na conta de quem quer que seja. Além de ser uma pratica proibida, ela sabe muito bem que existem muitos petistas em Brasília que querem cassar sua concessão. Mas nada impede que seus fornecedores o façam. Só esse pequeno tempero já é suficiente para sentir a temperatura do prato que está no forno. E talvez até explique a visita recente do senador Aloísio Mercadante ao Palácio Bom Conselho.

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Será ingenuidade?

Vereadora Pollyana muda de lado

       O debate sobre o Programa ReLuz revelou algumas mudanças na correlação de forças da Câmara Municipal. A que mais chamou a atenção foi a firmeza da vereadora Pollyana Gama na defesa do Palácio Bom Conselho. Uma atitude que mereceu rasgados elogios de Felipe Peixoto, filho do prefeito, em programa da TV Cidade (ver mais em Temperos da Tia Anastácia, pág 3).
       A vereadora apresentou um texto feito por sua assessoria. CONTATO apurou, porém, que o autor desse trabalho é um engenheiro, assessor do prefeito Roberto Peixoto. A vereadora usou esse “estudo” para “provar” que o “Projeto Reluz é viável (...) [porque] não possui superveniência financeira, ou seja, ganho financeiro acima da inflação”, ela afirma em release enviado à imprensa.
       A professora perdeu uma ótima oportunidade de ficar calada. O problema, como pode ser visto na reportagem, não está na viabilidade ou não, mas na estranha mudança de conduta por parte da Bandeirante. Questionar a passividade da Prefeitura diante episódio, além de saudável, é uma obrigação do Poder Legislativo.
       Vereador Carlos Peixoto (PMDB) foi muito mais transparente e explícito do que a vereadora na sessão que aprovou o financiamento. Ele não vacilou em determinar que a maioria exigida para a aprovação era de 8 vereadores e não de 9 e mandou que os insatisfeitos procurassem seus direitos na Justiça. Não precisou se esconder atrás de nenhum “estudo” para assumir seu alinhamento com o Palácio Bom Conselho.
Já o comportamento de vereadora Pollyana tem sido muito criticado por seus colegas que trabalham na área de educação. O desgaste junto às suas bases talvez explique sua nova postura política quando afirma que “não voto no partido, eu voto no projeto”. Projeto de quem cara-pálida, da prefeitura ou da Bandeirante? O Programa é bem vindo, porém, o mau uso de recursos públicos é inadmissível.


Pollyana com seus assessores