|  É fácil compreender que em novelas que se passam na 
              época da escravidão haja grande número de serviçais 
              nas imensas casas das fazendas. O que me intriga, porém, 
              é o que acontece em outras tramas, histórias que se 
              desenrolam nos dias de hoje em cidades como Rio de Janeiro e São 
              Paulo. Nelas podemos ver famílias ricas vivendo em casas 
              enormes ou luxuosos apartamentos, assistidas somente por uma empregada. 
              Sabemos todos que ela não daria conta do recado. Em “Belíssima”, tenho tido a oportunidade de 
              observar as proezas das funcionárias ali presentes. Cada 
              uma em seu emprego, desenvolvendo trabalhos mais ou menos parecidos.
 Aparentemente a que menos se esfalfa é a governanta da mansão 
              de Júlia, que depois passou a servir ao vilão André. 
              Podemos facilmente imaginar que ela apenas supervisiona o que fazem 
              outras serviçais da residência. Sempre trajada de terninho, 
              é ela quem serve as refeições, desde o raiar 
              do dia, até o licorzinho após o jantar, o que acontece 
              em horas tardias.
 No apartamento de Mary Montila, Mônica é uma empregada 
              especial. Jovenzinha, exibindo a cada dia um novo modelo de uniforme, 
              consegue dar conta da casa, comida, roupa lavada e ainda cria o 
              menino Toninho desde bebê. Além disso, encontra tempo 
              não só para namorar, como para longas conversas com 
              a patroa que, fingindo protegê-la, interfere drasticamente 
              em sua vida sentimental, querendo com isto tirar proveito sem que 
              a mocinha perceba.
 Outra “faz tudo” é aquela da casa dos Sabatini. 
              Afora o serviço normal, ela atende a todos os telefonemas 
              e depois, com a chegada do garoto à casa do pai, é 
              ela quem lhe serve de babá.
 Mas a que mais reclamações trabalhistas teria é 
              Regina da Glória, verdadeira escrava do casarão. Tem 
              tanta gente morando sob o mesmo teto, que nem consigo contá-los 
              ao certo. Entre mãe, filha e netas, são várias 
              mulheres que não movem uma palha. Muito menos os homens. 
              Na casa do turco, a pobre nordestina é quem trabalha como 
              moura. Além de fazer a limpeza, arrumar a casa, lavar e passar 
              roupa (muitas), cozinhar, servir a mesa na hora do almoço 
              e do jantar, varrer o quintal, ir à padaria, ainda tem que 
              saber onde estão as coisas perdidas. Servir cafezinho às 
              visitas. E vigiar para que o gato não fuja. Apegada como 
              é à família, tem apreço por todos. Ouvindo 
              conversas, quer dar seus palpites e quando principia a falar, logo 
              calam-lhe a boca e ela mesma repete o que está cansada de 
              ouvir: “Já sei, lugar de empregada é na cozinha”.
 O tratamento dispensado às empregadas é pior do que 
              aquele que antigamente se dava aos escravos que viviam na casa-grande. 
              Estes, muitas vezes tinham ligações sentimentais com 
              a família, como as amas de leite ou as crianças que 
              cresceram brincando com os filhos dos senhores.
 Nos folhetins, tudo o que é hoje considerado politicamente 
              incorreto é despejado em cima das prestativas “secretárias” 
              do lar. Impressiona-me o tom ríspido das ordens dadas pelos 
              patrões. Por vezes parecem gentis quando lhes dizem “pode 
              ir dormir”. Só que isto acontece lá pelas onze 
              horas da noite...
 |