Aos 
                      que escrevem dissertações e teses sugiro que 
                      leiam sempre algum bom autor. Na relação, 
                      e em primeiro lugar, Machado de Assis. Claro, sensível 
                      e elegante, como ele ninguém se apresentou ao público 
                      fluindo palavras e enredos apaixonantes. E acho que, em 
                      nossa cultura, dificilmente outro será tão 
                      prezado. 
                      Pois bem, dia destes, para distrair de temas áridos 
                      que ocupam minha cabeça de aprendiz de escritor, 
                      puxei da estante o Memorial de Aires e me deparei com uma 
                      frase que me fez parar a leitura: “chego aos meus 
                      sessenta e... não escrevas todo o algarismo, querido 
                      velho; basta que o saiba teu coração e vá 
                      sendo contado pelo Tempo no livro de lucros e perdas”. 
                      A força arrebatadora deste pensamento me fez ir a 
                      um caderno onde, ao longo dos anos, anoto frases capitais 
                      que se me formulam como uma espécie de guia. Eis 
                      algumas que me fazem pensar na topografia da vida e na necessidade 
                      de sair do plano mínimo da existência.
                      Longe de ser espiritualista, aprendi respeitar uma religião 
                      capaz de sentenciar os seguidores com ponderações 
                      contundentes como esta: “cada um terá que dar 
                      conta da inutilidade voluntária da sua existência”, 
                      de Allan Kardec. Como é fatal isto! 
                      Aliás, sobre a ética da vida tenho outra passagem 
                      que mais que me arrebatar, faz supor a inevitabilidade da 
                      consciência de nossos atos, Millor Fernandes escreveu: 
                      “viver é desenhar sem borracha”. Como 
                      isto é verdadeiro. 
                      Ainda na linha da moral da existência, selecionei, 
                      faz tempo, uma outra máxima, desta feita destilada 
                      da sabedora árabe “os homens são como 
                      tapetes: às vezes, precisam ser sacudidos”. 
                      O grande frasista e autor inglês Oscar Wilde pontificou 
                      que “muitas vezes, quando pensamos que estamos experimentando 
                      nos outros, estamos, na verdade, experimentando em nós 
                      mesmos” e assim, propõe limites à nossa 
                      capacidade de ver nos outros aspectos bons ou negativos 
                      que não vemos em nós mesmos. Nesta mesma senda, 
                      recordo-me de Rubem Figgot ao dizer que “não 
                      gostamos nos outros aquilo que detestamos em nós 
                      mesmos”, e, como não reconhecer isto?
                      É verdade que muitas destas frases são de 
                      efeito lógico, mas algumas o fazem com humor incontido. 
                      Imaginemos, por exemplo, que o grave alemão Goethe 
                      disse “você se conhece? Eu me conheci e saí 
                      correndo”. Independentemente da picardia, porém, 
                      há autores, como é o caso do pensador italiano 
                      Norberto Bobbio, que extraindo moral da história 
                      afirma que “o labirinto nos ensina não é 
                      onde está a saída, mas quais os caminhos que 
                      nos levam a lugar nenhum”. 
                      A sentença dada em favor do sofrimento sugere outra 
                      citação, também fatal, de Otto Lara 
                      Resende que, costurando a apologia da infância com 
                      a ação consciente da vida, contrasta a experiência 
                      da apatia dizendo que “uma criança vê 
                      o que um adulto não vê. Tem olhos atentos e 
                      limpos para o espetáculo do mundo. O poeta é 
                      capaz de ver pela primeira vez o que de tão visto 
                      ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio 
                      filho. Marido que nunca viu a própria mulher. Isso existe 
                      às pampas. Nossos olhos se gastam no dia-a-dia, opacos. 
                      É por aí que se instala no coração 
                      o monstro da indiferença”. 
                      Mas há também trechos que selecionei que falam 
                      de amor. Nesta linha, correm alguns dos meus favoritos dizeres. 
                      Guimarães Rosa não poderia faltar e dele tenho 
                      esta tirada: “qualquer amor já é um 
                      pouquinho de saúde”. E sobre o risco da entrega 
                      ao amor, do cancioneiro nacional, selecionei uma passagem 
                      que me é bastante querida: “deixe que o beijo 
                      dure, deixe que o tempo cure”, seus autores, Jorge 
                      Drexler e Zélia Duncan, assumem a inevitabilidade 
                      da paixão e suas compensações na desilusão 
                      marcada pelo tempo que tudo apaga. Complemento desta “lição”, 
                      recortei duas frases de Lacan quem são preciosas, 
                      uma bem humorada e outra inscrita na gravidade do moderno 
                      pensamento psicoanalítico: “não deixe 
                      para amanhã a dieta que você pode fazer adiar 
                      hoje” e “todo o saber é defesa contra 
                      o desejo”.
                      É evidente que não poderia terminar sem o 
                      registro de outras frases. Na verdade apoio-me em duas que 
                      se enlaçam num beijo de despedida. Pierre Marivaux 
                      recorda que “escutar bem é quase responder” 
                      e Wilson Mizner arremata afirmando que “se você 
                      rouba idéias de um autor, é plágio. 
                      Se rouba de muitos autores, é pesquisa”. 
                      Meus caros leitores, espero que ao escutar estas palavras 
                      eu tenha respondido a algumas questões pessoais e 
                      que considerem o que fiz nesta crônica foi relatar 
                      uma pesquisa, não plagiar vários autores.