Espelhos (clique)

Por: José Carlos Sebe Bom Meihy

As mulheres brasileiras que saem em busca de um futuro melhor têm sido sistematicamente vítimas de violência no exterior. Sebe relata alguns casos e constata que eles mostram que há uma cruel marca comum: a solidão das moças que buscam compensação em amores arriscados.

Como muitos sabem, o drama dos brasileiros que vivem fora do Brasil me comove. Tenho dedicado pesquisas pacientes a este tema que, contudo, continua atordoando a muitos que têm sensibilidade para apontar que as razões do drama que vão além dos percalços econômicos nacionais e da busca de oportunidades materiais.
Sempre achei que mais do que as explicações financeiras ou profissionais há impulsos que são de outra ordem: sentimentais, de reorganização dos projetos pessoais e íntimos, fatores que, afinal, também determinam mudanças. Entre tantos temas decorrentes desse fluxo imigratório acelerado, as histórias de amor me enternecem. Presto bastante atenção a casos especiais e ao longo dos meses vou juntando recortes de jornais com histórias. Nesta linha, tenho notado que quase sempre mulheres brasileiras são envolvidas em crimes, alguns trágicos demais. Mesmo sabendo que este problema afeta também outros grupos migratórios, vale ressaltar o nosso caso.
Em meados de dezembro de 2005, os jornais noticiavam mais um caso que nos últimos cinco anos tem aumentado geometricamente. Uma jovem paulista de nome Ana Elisa Toledo, de 24 anos, foi assassinada enquanto dormia, no Estado do Colorado, em Denver, onde fora estudar. O criminoso era seu ex-namorado, de apenas 19 anos, um tcheco também imigrante que lhe desferiu várias facadas e, sozinha, reclusa em um quarto, ela morreu.
Esta história me fez recordar outras que, como sempre, aqui como alhures, trazem as mulheres como vítimas preferenciais. O caso de Ana Lúcia Bandeira Bezerra, a dançarina de 31 anos que morreu de overdose de cocaína, em Gênova, no mês de setembro, chamou atenção por ela ter sido induzida ao consumo pelo ator italiano Paolo Calissano. Em outubro do mesmo ano, uma carioca de 17 anos, de nome Janaina Reis, foi morta em Deefield Beach, na Flórida, pelo porto-riquenho Juan Rafael Arrieta-Rolón, de quem era namorada por apenas duas semanas. Em todas as histórias, sexo, ciúme e violência se misturam em uma combinação fatal.
Estes casos mostram que há uma cruel marca comum: a solidão das moças que buscam compensação em amores arriscados. O fato de termos cerca de um óbito por mês faz com que pensemos nas razões específicas que caracterizam os crimes de brasileiras fora do Brasil. Logicamente, não nos basta repetir que “ora” repete-se uma prática que é quase universal: homens matando mulheres em casos de amores escusos ou impossíveis.
Fora do país, sem instituições que as protejam e sempre carentes de aparo familiar e mesmo de amizades, estas garotas se mostram mais vulneráveis. Outro aspecto a ser notado é a relação com amantes ou companheiros, sempre estrangeiros. Isto coloca em evidência mais um ponto importante: a questão cultural e a compreensão do que significa o uso do corpo em situações de deslocamento identitário.
É lógico que é rico pensar em amores de pares de culturas diferentes. Quantos exemplos positivos temos! Mas, no caso de moças solitárias, principalmente fora do país de origem, muitas vezes, a confusão entre a busca de companhia e parceria por sexo puro e simples pode levar a situações em que o confronto cultural chegue ao limite do suportável. Ademais, a constatação de que casos inversos, ou seja, de homens brasileiros que se relacionam com mulheres estrangeiras, principalmente em face da imigração fora do Brasil, refletem melhores resultados, nos faz pensar nas razões profundas que permitem tais circunstâncias.
Pensando na gravidade do problema e levando-se em conta a questão da solidão das mulheres no exterior, cabe notar que além de se manter uma regra infeliz de subjugo do sexo feminino às premissas do machismo, duplica-se o risco que apenas pode ser aliviado se mais do que buscar parceria houver esclarecimento cultural. E, é claro, amor.

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