Apesar da omissão explícita do vereador Henrique Nunes (PPS), presidente da Câmara, e do apoio da base aliada de Roberto Peixoto para impedir a convocação do seu chefe de Gabinete, vereadores se articulam para apurar denúncias sobre um suspeitíssimo episódio muito similar aos ocorridos em Brasília

A denúncia de que Fernando Gigli Torres, chefe de Gabinete do prefeito Roberto Peixoto (PSDB), quitou dívidas da prefeitura com dinheiro da sua própria conta bancária explodiu como uma bomba tanto no Palácio Bom Conselho como na Câmara de Taubaté. A informação foi revelada com exclusividade por CONTATO na última edição 262. De acordo com a reportagem, pouco mais de R$ 7 mil, em dinheiro, foram pagos à TV Vanguarda, através da ACIT (Associação Comercial e Industrial de Taubaté), referentes a veiculação da campanha Iluminatau, em dezembro de 2005.
Na segunda-feira, 27, a nuvem de fumaça que pairou sobre a administração não escondeu por muito tempo os estragos provocados pelos estilhaços. Na terça-feira, 28, durante a 50ª sessão da Câmara, a base aliada tentou minimizar as chances de convocação do homem de confiança de Peixoto para prestar esclarecimentos sobre o caso.
A sessão, presidida por Luizinho da Farmácia (PDT), começou atrasada e com apenas três vereadores em plenário – Luizinho, Chico Saad (PMDB) e Jeferson Campos (PT). A maior parte dos vereadores começou chegar a partir das 20h.
Na abertura da sessão, Jeferson Campos apresentou requerimento solicitando a convocação de Fernando Gigli. Porém, o peemedebista Chico Saad, que integra a base governista, pediu destaque do pedido. Com a iniciativa, a discussão do assunto foi adiada para a sessão da próxima terça-feira, 4.
Bastava a adesão de um terço dos parlamentares para que a proposta fosse levada ao plenário. O requerimento foi assinado por seis dos 14 vereadores, aprovando a convocação de Gigli. Aderiram à proposta Roderico Prata Rocha (PSC), Maria Gorete (sem partido), Waldomiro Silva (PL), Maria Tereza Paolicchi (PSC), Orestes Vanone (PSDB) e Pollyana de Araújo (PPS).
Campos acredita que a convocação será aprovada. Ele classificou o caso como “gravíssimo”. No plenário, o autor da proposta defendeu a abertura de uma CEI (Comissão Especial de Inquérito) para apurar as denúncias que envolvem o chefe de gabinete do prefeito de Taubaté. “Não basta simplesmente o requerimento. Temos que investigar as denúncias apresentadas na reportagem. Precisamos saber de onde saiu o dinheiro e como a prefeitura vai ressarci-lo [Gigli], essa é uma das principais questões. Não é normal uma pessoa pagar conta de uma prefeitura. Gigli deve vir a público se explicar”.
Ouvido posteriormente por CONTATO, Campos cobrou um posicionamento rápido da Câmara e cogitou levar o caso a Justiça. “A Câmara deve se posicionar urgentemente e investigar uma denúncia desse tamanho, senão isso vai virar escracho com a população. O Legislativo não pode cair em descrédito. Se não houver apoio político iremos apelar ao Ministério Público, embora eu considere que a Câmara vai ficar mal com a opinião pública”, disse.
Os vereadores Orestes Vanone e Maria Gorete também defenderam na tribuna a convocação de Gigli durante a última sessão da Câmara. Vanone e Gorete concordam ao dizer que “nada mais oportuno do que dar a Gigli a chance de se defender e explicar o que está acontecendo à população”.
O ex-presidente da Casa, que considerou grave o caso, também acredita na aprovação do requerimento na próxima terça-feira. “Gigli tem que se defender das graves acusações. Isso também servirá para que a Câmara tenha esclarecimento do que houve”.

Na Câmara
Cotado para substituir Carlos Peixoto (PSC), na liderança do governo junto a Câmara, o vereador Luizinho da Farmácia, que presidiu a sessão da última terça, comentou na quinta-feira, por telefone, que “vê o caso com receio”. “A partir do momento em que forem apresentadas provas, poderemos [os vereadores] tomar uma atitude relevante. A acusação é grave, achacamento do dinheiro publico é preocupante. O Ministério Público tem que averiguar. Vamos tomar uma posição e acredito que a prefeitura também. Se for preciso, vamos encaminhar o caso para Justiça até que tudo seja esclarecido”.
Questionado por que não assinou o requerimento que prevê a convocação de Gigli, Luizinho alegou desconhecer a existência do pedido apresentado pelo vereador do PT. “Não sabia do requerimento, não me consultaram [na sessão] nem me pediram para assiná-lo. Não assinei porque não tive conhecimento”.
Sobre o encontro com o chefe de gabinete na segunda-feira, flagrado por CONTATO, Luizinho confirmou que foi procurado por Gigli, mas negou que ele tivesse pedido respaldo na Câmara. “Ele não me procurou para pedir respaldo da Câmara ou explicar o caso”. Luizinho disse também que não conversaram sobre o assunto no encontro. “Quando nos encontramos, eu ainda não sabia da reportagem. Soube só na terça-feira, na Câmara”, disse.
Segundo Luizinho, o almoço foi uma reunião com empresários do ramo de reciclagem.
Outro representante da base aliada, Ângelo Filippini, do PSDB, disse, por sua vez, que não assinou o requerimento solicitando a convocação porque o documento não passou por ele na Câmara. “Do contrário, eu teria assinado”, afirmou.

Gigli
No sábado, 25, Fernando Gigli afirmou textualmente ao diretor de redação de CONTATO, Paulo de Tarso Venceslau, que “ele faz o que ele quiser com o dinheiro dele”. Desde o final de semana, Gigli corre para escapar dos efeitos de uma possível Comissão Especial de Inquérito (CEI) na Câmara. Por telefone, ainda durante o fim de semana, Gigli também teria procurado o presidente da ACIT (Associação Comercial e Industrial de Taubaté), André Saiki, mas a conversa teria sido pouco amistosa.
Na segunda-feira, o homem de confiança de Peixoto procurou o vereador Luizinho da Farmácia num de seus estabelecimentos, de onde saíram juntos, no carro de Gigli, por volta das 12h.
Na quarta-feira, 29, por volta das 17h30, a Câmara protocolou uma carta assinada por Fernando Gigli em que o chefe de gabinete do prefeito Peixoto se dispõe a se apresentar na próxima segunda-feira, 3, para prestar esclarecimentos aos vereadores. A apresentação está marcada para as 15h.

Ministério Público
A 10ª promotoria de Justiça e Cidadania de Taubaté já está investigando o caso. Procurado por CONTATO, o promotor José Carlos de Oliveira Sampaio preferiu não se pronunciar sobre o assunto.

OAB
Para o presidente da 18ª subsecção da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Paulo de Paula Rosa, trata-se de “uma matéria que ainda depende de apuração e por isso a OAB fica à distância, sem adotar um posicionamento. Isso pode até dificultar o trabalho do colega [advogado] que possa vir a defender o Fernando Gigli na Justiça”.

Reflexos
A denúncia que envolve Gigli desencadeou uma crise interna no governo e revelou uma fissura profunda que divide o primeiro escalão da administração Peixoto. CONTATO apurou que pelo menos duas reuniões restritas foram realizadas na segunda-feira, 27. Numa delas, por volta das 9h, o diretor jurídico da prefeitura, Luís Rodolfo Cabral esteve com o diretor de Turismo, Antonio Roberto Paolicchi.
Uma outra reunião foi convocada pela diretora de Planejamento, Silvia Ramiro, considerada o braço-direito e uma das pessoas que mais exerce influência sobre a primeira-dama. Do encontro teriam participado somente funcionários diretamente ligados à Luciana Peixoto.
O grupo estaria articulando a queda de Gigli e a troca de comando no Jurídico. A saída de Cabral, portanto, seria apenas uma questão de tempo. Mas, enquanto isso, integrantes do primeiro escalão trabalham para inibir qualquer oposição comandada por Silvia Ramiro e Luciana Peixoto.
No encontro convocado por Ramiro teriam sido cogitados nomes para ocupar a pasta, entre eles, o do procurador Paulo Vieira, que trabalha desde 1991 na prefeitura.
CONTATO apurou que para evitar maiores prejuízos e salvar a administração, uma das saídas estudadas seria a saída de Gigli do governo.
A assessoria de imprensa da prefeitura negou que as reuniões tivessem ocorrido.

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