CONTATO
- Quantos anos de samba?
Crisante –
O samba veio logo depois que eu parei de jogar futebol, em 1971.
Em 77, acompanhei a Mangueira quando cantou “O Mundo Encantado
de Monteiro Lobato”, tema que o Oswaldo Barbosa Guisard, grande
escritor, passou o tema para a Mangueira que conseguiu ser campeã
no Rio de Janeiro. Depois da conquista, a Mangueira veio até
Taubaté para agradecer e desfilar em praça pública.
Por isso, muitos taubateanos são mangueirenses.
CONTATO
- Quanto tempo no futebol?
Crisante – Foram onze anos e meio jogando no profissional.
No amador, comecei nas bases do EC Taubaté, em 1954. Fui
campeão pelo Burrão umas seis vezes. Voltei da minha
andança de profissional e fui jogar pelo Taubaté novamente.
Depois assumi o time profissional como técnico, em 76.
CONTATO
- E hoje, eles têm a ver com você?
Crisante – Sou disciplinado naquilo que faço.
Ganhei um troféu Belfort Duarte, da Federação
Paulista de Futebol, por ter sido um jogador profissional, em 10
anos, sem nenhuma ocorrência disciplinar. E no samba não
é diferente. Depois que fiquei veterano me dediquei ainda
mais ao samba, à poesia. São as paixões da
minha vida.
CONTATO
- Quem veio antes: futebol ou samba?
Crisante – O futebol, sem dúvida. Mas uma
coisa acompanha a outra. O futebol foi a minha vida. No meu tempo
era difícil porque só falavam dos times de São
Paulo. Por isso quem jogava no interior era do interior e ponto.
Consegui alguma coisa jogando futebol em Bauru, mas isso foi há
40 anos. Lá, fiz duas faculdades. O futebol me deu condições
de estudar. Fiz Educação Física e cursei uma
parte da faculdade de Direito. Fiz quatro cursos de futebol profissional
fora do país. Quando assumi o EC Taubaté já
era técnico profissional.
Crisante e os troféus conquistados no samba
que ele guarda em sua casa
CONTATO
– Por quais times jogou?
Crisante – Comecei na base do Taubaté, fui
para Jaboticabal e de lá para o Taquaritinga. Depois estive
no Santos. Fui emprestado para outros times como o Rio Branco de
Ibitinga e o Noroeste, de Bauru, onde minha carreira durou mais:
fiquei lá de 1964 a 70. Depois, em 71, voltei para Taubaté.
CONTATO
– Sua influência maior vem do samba ou do futebol?
Crisante – Do futebol estou um pouco afastado. Mas
me alegro em ver o Sandro Fonseca voltar a jogar no Taubaté.
Ele foi meu aluno e foi indicado ao Flamengo. É bacana isso.
Espero que o Taubaté volte a ocupar o lugar que é
seu, subindo de divisão. O Taubaté é a primeira
potência da cidade. A segunda é o bloco Vai Quem Quer.
CONTATO
– E por que parou de jogar?
Crisante – Terminei minha carreira no futebol cedo
porque tinha muita saudade de Taubaté e porque também
tive uma contusão séria. Isso me desanimou. Tinha
29 anos, estava quase na hora de parar.
CONTATO
– Qual sua opinião sobre o samba e o futebol atuais?
Crisante – Na realidade, tudo se industrializou.
No futebol, o jogador que conseguir fazer uma boa partida, logo
fica cheio de gente de olho nele. Não é saudosismo
quando falamos da velha-guarda, mas tínhamos que nascer agora
(risos). Com o Carnaval não é diferente.
CONTATO
– Falta originalidade?
Crisante – Antigamente, se ganhava com samba no pé,
sem fantasia, sem nada. Depois que Joãozinho 30 começou
valorizar muito o visual, industrializou o samba. No Rio, por exemplo,
é negócio feito para turistas que chegam e tomam conta.
“O
samba está industrializado”
CONTATO – Isso é ruim?
Crisante – Financeiramente, não. Mas, a escola
que só põe turista para desfilar acaba tendo problemas,
como aconteceu com a Estácio de Sá, que foi campeã
com o enredo Paulicéia Desvairada, e no ano seguinte a escola
ficou cheia, ninguém cantou samba e acabou em décimo
lugar.
CONTATO
– Quando se envolveu com o carnaval?
Crisante – Assim que parei com o futebol e voltei
para cá, entrei de corpo e alma. Logo comecei freqüentar
o carnaval do Rio. Aqui havia um grande carnaval em 74. Quem comandava
era a Império do Morro, junto com o Chafariz. Daí
começaram entrar as regras do samba e o carnaval ficou ainda
mais forte. Todos iam para o Rio, de onde o carnaval de Taubaté
recebeu muita influência. Era a Vila São José,
na Portela. A Estiva, no Salgueiro. Império do Morro, na
Mangueira etc. Todo mundo se encontrava lá.
CONTATO
– E você compõe samba. Sabe quantos escreveu?
Crisante – De cabeça, é difícil
saber. Acho que em Taubaté já desfilaram uns 30 sambas
vencedores. No geral, contando sambas que desfilaram em outras cidades,
deve ter uns 60 que venceram.
CONTATO
– Quando começou compor?
Crisante – O primeiro samba, na verdade, não
compus. Só terminamos um samba, em 74, que era do Estiva,
chamado “Tabaeté”. Mas foi campeão. Foi
aí que senti que tinha jeito e fui me interessando mais.
Crisante
e o CD que ele gravou em homenagem aos 90 do E.C. Taubaté
CONTATO
– Quem foram seus parceiros?
Crisante – Em Taubaté compus muito com o Mauro
Duarte, o Expedito, outro grande compositor, o Jaú, Marquinhos
e outros.
CONTATO
– Quem é o principal compositor da atualidade?
Crisante – Ainda acho que é o Davi Correa.
Porque foi ele que fez os grandes sambas da Portela, Viradouro,
Mangueira. Em todas escolas que concorreu, ele ganhou. É
dele o samba “Atrás da verde e rosa só não
vai quem já morreu”.
CONTATO
– Qual será a maior sacada desse carnaval?
Crisante – Quando as escolas estão bem preparadas
fica difícil antecipar. A não ser que alguém
erre ou dê um furo tecnicamente. Se todo mundo passar bem
[na avenida], ganha aquela que a torcida cantar o samba. Quando
levanta o povo, quando mexe com a massa, fica difícil não
ganhar. A surpresa desse ano, no Rio, é a Tijuca que vem
com Mozart para fazer sinfonia na avenida. É inovação,
e o povo vai cantar junto. Antes deles, só a Beija-Flor tinha
feito algo parecido.
CONTATO
– Nessa tendência vem você e a BBC tocando “Ave
Maria”, de Gunot...
Crisante – Vamos fazer uma homenagem a Campos do
Jordão. Essa idéia nasceu há seis meses. Vamos
falar dos festivais, da suíça brasileira. A maior
câmara de musica clássica da América Latina
está em Campos. No refrão, vamos fazer a Ave Maria.
Por que não podemos cantar isso na avenida?
CONTATO
– Comente um pouco mais...
Crisante – O bloco BBC faz nesse ano uma homenagem
para Campos do Jordão. Vamos gravar essa música e
ver o que vai acontecer. Tomara que o povo aceite. Acredito nessa
combinação e em tudo que venha para melhorar. Algumas
baterias daqui vão sobressair no carnaval porque estão
fazendo adaptações, como o Chafariz, a Vila das Graças
e a X-Taubateana, que vai colocar olodum na bateria.
CONTATO
– Em abril, o Percival Pires, que é de Taubaté,
deve ser eleito presidente da Mangueira. Isso ajudaria o carnaval
daqui?
Crisante – Por ser de Taubaté, o Perci sempre
nos ajudou. Ele foi mocinho para a Mangueira, no tempo da Nelma,
da Zica, do Cartola e ficou. Com ele na presidência, fica
mais fácil ter acesso lá. Não é novidade,
mas ele [Perci] tem ajudado muito uma escola daqui, que não
vou dizer o nome. Vieram várias fantasias de lá [Mangueira]
para cá. Talvez venha mestre-sala e porta-bandeira para desfilar
em Taubaté.
CONTATO
– E suas andanças com o Vai Quem Quer nos jogos da
Copa do Mundo?
Crisante – O Vai Quem Quer é a coisa mais
gostosa que tem. Já estamos fazendo um tema para esse ano.
A música é minha e fala do Daniel Sbruzzi. Esse ano
ele vai para sua oitava Copa do Mundo na Alemanha. Não é
para qualquer um. São 32 anos de Copa. É muito bom
acompanhar o Vai Quem Quer, que também tem uma diretoria
espetacular. O Vai Quem Quer é uma potência tremenda.
No carnaval, você vai ao Alto do Cristo e lá tem um
cara fantasiado de mulher dizendo assim: “eu vou pro Vai Quem
Quer!”. Se for lá no bairro Santa Fé, você
vai encontrar outro cara fantasiado falando “sou do Vai Quem
Quer!”. Todo mundo é do Vai Quem Quer. As andanças
internacionais do Vai Quem Quer também são excelentes.
Nessa Copa vamos para Alemanha e o Daniel será nosso comandante
da folia. Eu faço as músicas quando a gente viaja:
na França, no Japão, Coréia. Vamos começar
a fazer o refrão em alemão para ver se a gente se
entrosa mais.
CONTATO
– O que você espera do próximo desfile em Taubaté?
Crisante – Não vai ter muitas novidades, não
vai acrescentar muito. Para voltar a fazer como era antes, leva
tempo. Não é de uma hora para outra. Foi dado o ponta-pé
inicial pela prefeitura. Agora, depende de cada escola fazer sua
parte.
CONTATO
– Quais foram os melhores anos do carnaval em Taubaté?
Crisante –
O reinado mesmo foi de 74 a 84. Depois deu uma parada forte. O carnaval
de Taubaté ficou atrás de Guará porque lá
continuaram com a velha-guarda e colocaram os jovens para comandar.
Em Guará, uma escola gasta uns R$ 120 mil e ganha da prefeitura
uns R$ 25 mil. Eles ainda fazem eventos durante o ano, têm
patrocinadores, jovens e velha-guarda trabalhando em conjunto. Em
Taubaté, da velha-guarda, ficou meia dúzia de gatos-pingados,
como eu, fazendo samba. Aquela turma do samba ainda existe e se
der um cutucão eles voltam para ajudar. Nós temos
um Maracanã [a Avenida do Povo]. O que não pode é
colocar Bangu para jogar com Bom Sucesso. Temos a pista. Falta o
piloto e a equipe.
“Temos um Maracanã [a Avenida do Povo]. O que não
pode é colocar Bangu para jogar com Bom Sucesso”
Beto Carrapato, João Guaru, ex-presidente
do Vai Quem Quer e Crisante
CONTATO – Há espaço para os blocos crescerem?
Crisante – Os blocos estão numa tendência
de crescimento. É muito mais fácil fazer um bloco
do que escolas de samba. O Vai Quem Quer tem uma novidade esse ano:
sai como bloco de enredo, ou seja, vai desfilar com um tema. Além
disso, é quase uma escola de samba. Vai ter enredo, comissão
de frente, bateria, mestre-sala e porta-bandeira e ainda vai ter
banda. Tomara que outros blocos sigam o exemplo do Vai Quem Quer
para o ano que vem, e isso também serve às escolas
de samba.
“Tomara
que outros blocos sigam o exemplo do Vai Quem Quer para o ano que
vem, e isso serve às escolas de samba”
CONTATO – Arrisca um palpite sobre esse carnaval?
Crisante – As escolas que desfilam há mais
tempo levam grande vantagem sobre as outras porque já têm
seus carros-alegóricos. Para quem tem aquele esqueleto é
meio caminho andado. As três escolas que devem disputar o
título são: Mocidade Vila das Graças, Boêmios
da Estiva e Chafariz, que volta esse ano à avenida junto
com a Santa Fé.
CONTATO
– Está muito longe a profissionalização
do carnaval taubateano?
Crisante – Não. Pelo contrário, está
fácil. Quando se trabalha com gente séria para fazer
o carnaval, com fiscalização para saber a situação
do dinheiro, não tem segredo. Agora, se não tiver
prestação de contas fica difícil. Mas, se todos
trabalharem sério, não tem erro. Tem que começar
pela diretoria das escolas. Se não tiver credibilidade, não
pode cuidar de escola de samba. Só depende de credibilidade.
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