Por Paulo de Tarso Venceslau

Maus presságios
Cercados por simbolismos aparentes (ou brincadeiras de péssimo gosto), casos ocorridos nos últimos dias parecem anunciar que o perigo mora ao lado.


"Fusilamientos de 2 de mayo" pintura de Francisco Goya

Dois episódios que marcaram nossa história recente: o brutal assassinato do advogado José Ismael Pedrosa, ex-diretor da Casa de Custódia de Taubaté e da Casa de Detenção, dois anos depois que se aposentou, após 45 anos de trabalho no sistema prisional, e a confecção e distribuição de cartazes que retratam, por meio de montagem, o senador Jorge Bornhausen (PFL-SC) como um nazista.
Embora tenham ocorrido em espaços diferentes e se refiram a episódios de natureza igualmente distintas, os mesmos podem anunciar situações preocupantes. O assassinato de Pedrosa pode representar uma forma de intimidar nossas autoridades responsáveis pela repressão que podem levar à prisão e à condenação perigosos bandidos que há muito já perderam as noções mais elementares de civilidade.
O discurso sociológico barato que reduz às causas de violência aos desníveis sociais não pode prevalecer num momento como esse. O Brasil, sem dúvida, é um dos países que apresentam os maiores indicadores de desigualdade social. Isso é inegável e inquestionável. Porém, é inaceitável que essa triste realidade seja usada por muita gente para “explicar” as causas de crimes como esse que tirou a vida de Ismael Pedrosa.
O Brasil tem milhões de exemplos de gente pobre e miserável que, longe de qualquer conformismo, colocam certos valores humanos elementares acima dos problemas reais enfrentados. São esses valores que distinguem a espécie humana de outros animais que possuem predadores que os devoram dentro da lógica Darwiniana da sobrevivência diante da seleção natural.
Se alguns seres humanos se comportam como animais, como tal têm de ser tratados. Assassinar friamente um senhor de 70 anos de idade ou seqüestrar sua filha ou até mesmo sua neta como desejavam os bandidos do PCC, em 2001, são atitudes que não encontram justificativas em nenhum lugar do planeta porque ameaçam o convívio mais elementar entre seres pensantes.
Calar-se diante de um quadro extremamente ameaçador como esse pode parecer que estamos pacificamente admitindo uma situação inaceitável. Ao Estado republicano cabe a responsabilidade, e para isso dispõe de recursos e legitimidade, de apurar as responsabilidades, prender, condenar e garantir que os culpados cumpram suas penas.
Em Brasília, a polícia federal tem mais uma missão. Além da de prestar esclarecimentos à sociedade dos avanços das investigações em curso sobre corrupção no governo terá de descobrir quem é o responsável pela confecção de cartazes que retratam, por meio de montagem, o senador Jorge Bornhausen (PFL-SC) como um nazista. Quem mandou fazer a peça? Quem imprimiu? Como foi paga a encomenda? Quem colou os cartazes em muros de Brasília?
Goste-se ou não de Bornhausen — e ninguém precisa concordar com o que ele diz nem considerar seu partido, o PFL, interessante apenas porque o PT se mostrou um blefe como opção ética e progressista —, é preciso evitar que a política se torne arena de disputas baixas e perigosas. Se os cartazes retratassem Lulas e Dirceus caracterizados de Stalin ou Fidel Castro, é fácil imaginar o tipo de reação “popular” que teríamos de enfrentar. Infelizmente, alguns ingênuos insistem em não ver que o que estão querendo
desmoralizar é o processo eleitoral de 2006.
O partido de Bornhausen é tão legítimo quanto o PT. Fingir que a confecção e distribuição se trata de um fato isolado é muito perigoso para a estabilidade política e pode ameaçar nossa incipiente democracia. Tão perigoso quanto admitir, do ponto de vista da segurança mais elementar da espécie humana, que o assassinato de Pedroso não passa de um episódio isolado.

 

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