Por Paulo de Tarso Venceslau

Caso Celso Daniel: mais um morto
Os crimes envolvem poder, muito dinheiro e até mesmo misteriosas relações afetivas. Nitroglicerina pura. Principalmente quando os efeitos deixam de ser colaterais e atingem as ante-salas do governo. Fica a pergunta: quem será o próximo?


O oitavo cadáver de pessoas envolvidas com o assassinato de Celso Daniel, ex-prefeito de Santo André, em janeiro de 2002, acaba de aparecer. Trata-se do corpo do médico legista Carlos Delmonte Printes que foi o primeiro a afirmar, categoricamente, que Celso havia sido barbaramente torturado. Naquela ocasião, o advogado e deputado federal Luis Eduardo Greenhalgh, a serviço do Partido dos Trabalhadores (PT), afirmava exatamente o oposto: insistia que se tratava de um crime comum e que não havia qualquer indício de que teria ocorrido tortura.
Delmonte, um profissional com mais de 20 anos de carreira, examinara minuciosamente o cadáver antes de emitir seu parecer que ficaria engavetado por longo período nos escaninhos da burocracia policial a pedido de dirigentes e parlamentares petistas junto ao governador Geraldo Alckmin. Estranho? Não. Apenas troca de favores, muito comum no mundo da política. O próprio legista revelaria mais tarde as pressões que teria sofrido para que mudasse suas conclusões.
Delmonte costumava trabalhar de madrugada num escritório fora de sua casa. Pessoas têm estranhezas. Mas e a carta deixada com instruções à família, escrita na segunda-feira? Pressentiu a morte? Miocardite? Delmonte era médico. Entendia de vida. Legista, entendia mais ainda de morte. Não há sinais de violência.
Espero que o governador acabe com os tais acordos políticos e faça com que as investigações prossigam. À Polícia de São Paulo seria prudente não se precipitar como já o fez o delegado que afirmou que tudo leva a crer que se trata de morte natural. Falou demais. Sem autópsia, o próprio Delmonte recomendaria silêncio a respeito. Algumas pessoas que se sabem condenadas por doença ou ameaçadas deixam cartas. Geralmente, avisam alguém que estão guardadas em tal lugar sob o compromisso de que só sejam abertas depois da morte. Seu procedimento foi incomum.
Para muitos dos protagonistas desta estranha história, o fim de Delmonte, mesmo que tenha sido acidental, caiu do céu. Já morreram: o garçon que foi o último homem que, fora Sérgio, “o Sombra”, viu Celso com vida; morreu o agente funerário Iran Moraes Rédua, o primeiro a ter reconhecido o cadáver; morreu o bandido que organizou o seu seqüestro, e agora morre o legista cuja perícia punha em questão a tese do crime comum. São oito misteriosas mortes ao todo, incluindo a do ex-prefeito.
Em 2002, caso não tivesse sido assassinado, Daniel assumiria o papel que depois foi assumido por Antônio Palocci. E este o teria substituído porque conheceria o caminho das pedras. Portanto, o drama envolve poder, muito dinheiro e até mesmo misteriosas relações afetivas. Trata-se de nitroglicerina pura. Principalmente quando os efeitos deixam de ser colaterais e começam a atingir as ante-salas do Palácio do Governo, em Brasília.

 

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