Por Marlon Maciel Leme

Pelo menos R$ 2,5 milhões foram gastos em julho, sem licitação, pelo Departamento de Educação, Cultura e Esportes (DECE) da prefeitura de Taubaté na compra de brinquedos, material didático e software. CONTATO apurou que cinco dos contratos foram firmados entre os dias 5 e 22 de julho, coincidentemente, em pleno recesso da Câmara Municipal.
O contrato de maior valor foi fechado com a editora Noovha América: R$ 1.575.000,00. O acordo prevê a aquisição de 70 mil exemplares da obra “Conto, Canto e Encanto com a minha história – Taubaté: cidade, educação, cultura e ciência”. O livro possui 140 páginas e é vendido a R$ 45. O material, que ainda não foi entregue ao DECE, deve ser recebido até a próxima semana.
Com a Brink Mobil Equipamentos Educacionais, o contrato que prevê a aquisição de um laboratório didático de matemática é de R$ 376.599,50. A empresa Edacom Tecnologia recebeu R$ 99.360,00 para fornecer um “projeto educativo para escolas” e mais R$ 587.000,00 na venda de brinquedos do tipo Lego. Outros R$ 399.872,70 foram destinados à empresa Caltech Informática, vendedora de softwares.
Ao todo, as compras somam R$ 2.451.419,20.
Procurada por CONTATO, a sócia-proprietária da empresa Noovha América, Sandra Regina Félix, disse que os exemplares adquiridos pelo DECE receberam 50% de desconto sobre o preço de capa. “Cada exemplar custou cerca de R$ 22”.
Por telefone, o diretor do DECE, José Benedito Prado, disse à reportagem de CONTATO que procurou o setor Jurídico e o de Compras e Licitação da prefeitura para avaliar o assunto. “Não houve problema algum. O que ocorre é que esses materiais são muito avançados e por isso também são muito caros. Por isso, chamou a atenção”, afirmou.
Sobre a não abertura de licitação, Prado informou que todos os materiais adquiridos foram comprados de fornecedores exclusivos. “É tudo material exclusivo; não existem outras [empresas] vendendo; nesses casos não é preciso fazer licitação”, assegurou.
O artigo 25 da lei federal 8.666/93, que estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos, assegura a não exigência de licitação somente quando houver inviabilidade de competição.
Fernando Gigli Torres, presidente da Comissão Permanente de Licitação

Explicação
Fernando Gigli Torres, chefe de Gabinete do prefeito Roberto Peixoto e presidente da Comissão Permanente de Licitação, afirmou que todas as compras foram realizadas depois que o departamento Jurídico, comandado pelo advogado Luís Rodolfo Cabral, emitiu parecer favorável. Isso, em tese, significa que os advogados da prefeitura não teriam encontrado nenhuma irregularidade no processo de compra.
Na terça-feira 25, o vereador Jeferson Campos (PT) esteve com Benedito Prado no Departamento de Compras conversando sobre a inexigibilidade das compras feitas pelo DECE em julho. “Foi uma conversa técnica. Ele me perguntou o porquê da não exigência de licitação. Não sei se o convenci [o vereador Jéferson]; ele é imprevisível. No meu ponto de vista, acredito que ele compreendeu”, disse Prado.
Ouvido por CONTATO, o vereador petista, que integra a Comissão de Fiscalização da Câmara, disse que encaminhou na tarde de quinta-feira, 28, requerimento ao prefeito Roberto Peixoto, solicitando cópias de todos os processos realizados sem licitação.
A prefeitura tem prazo de cinco dias para responder ao parlamentar.

Tudo exclusivo?
A respeito dos kits Lego (uma espécie de quebra-cabeça), Prado disse que a prefeitura compra esse tipo de brinquedo desde 2004. “Esse ano, estamos ampliando o volume de material para fornecer à rede [pública de ensino]. Estamos preparando o aluno, aliando educação e tecnologia. Esse material serve para auxiliar o aluno”, comentou.
Segundo diretor do DECE, o Lego vem acompanhado de uma revista que orienta o aluno a montar figuras no computador. “É um desafio”, resumiu.


José Benedito Prado, diretor do departamento de Educação Cultura e Esporte de Taubaté

Livros de presente
Os livros serão distribuídos entre alunos e professores do ensino infantil e fundamental da rede pública municipal e estadual. Funcionários do setor administrativo do DECE, alunos e professores do curso supletivo e da educação especial do ensino municipal também receberão exemplares do livro, voltado ao público infanto-juvenil. Trata-se da história ilustrada de Taubaté.
A obra faz parte de um projeto desenvolvido pela editora, voltado ao ensino fundamental. Regina Félix disse que é uma espécie de coletânea sobre Taubaté contada com uma linguagem facilitada e com muitas imagens. “É a preservação da memória da cidade; um resgate da história e da arte local”.
Segundo a proprietária da editora, a pesquisa foi desenvolvida num período aproximado de cinco meses.

E tem mais
Parte da compra, segundo Prado, foi feita com verba da Cultura. “É dever da prefeitura divulgar a história da cidade aos alunos do Estado”, argumentou.
O material também será distribuído entre as bandas que estarão em Taubaté de 7 a 14 de agosto para o campeonato mundial de fanfarras. “Também será entregue um exemplar [do livro] para cada corporação musical”, comentou Prado.
Advogados e administradores públicos consultados por CONTATO e que preferem manter-se no anonimato, asseguram que essas compras poderão ser contestadas e os responsáveis punidos. “É inadmissível a compra de livros por mais de R$ 1,5 milhão sem licitação”, afirma um conhecido político local, que complementa: “Nunca imaginei que isso pudesse acontecer”.

 

Pinda: TCE desaprova contas da prefeitura
Por Jorge Fernandes

As licitações que assombram os corredores do Palácio do Bom Conselho não são privilégio do Executivo taubateano. A vizinha, Pindamonhangaba parece sofrer da mesma indigestão. De acordo com o processo número 156/007/98 do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, a prefeitura de Pindamonhangaba executou durante a gestão do ex-prefeito Francisco de Assis Vieira serviços de engenharia de trânsito de forma irregular.
À época, a prefeitura de Pinda contratou o atual diretor de Trânsito de Taubaté, Monteclaro César Junior, para dirigir o departamento de trânsito do município. Segundo o processo do Tribunal de Contas, Monteclaro César recebeu R$ 7.6265.84 pelos serviços prestados. “Quisera ter eu recebido isso por mês”, respondeu Monteclaro ao ser questionado se este valor era mensal, ou não.
O diretor de Trânsito de Taubaté afirmou que suas atividades no Executivo de Pinda foram realizadas “dentro da legalidade” e que recebia por RPA –Recibo de Pagamento Autônomo. De acordo com Monteclaro, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE) questiona por que o executivo de Pinda não contratou um funcionário da casa para exercer tal função. “Acontece, porém, que, naquela época, a Prefeitura não tinha em seus quadros funcionários qualificados para o exercício”, rebateu Monteclaro, arquiteto com pós-graduação em Trânsito e Transportes Urbanos.
O episódio de Pinda revela que o artigo 25 da lei 8666 não é facilmente digerido pelo TCE. Se a compra for concretizada, mais dia, menos dia, os responsáveis poderão ter o desprazer de enfrentar as barras dos tribunais. É inacreditável que num momento como esse, quando o governo federal está sendo posto em cheque, a prefeitura de Taubaté tenha a ousadia de realizar essas compras. Aguardar para ver.


Outro lado
A prefeitura de Pindamonhangaba não se pronunciou sobre o caso até o fechamento dessa edição. O ex-prefeito Francisco de Assis Vieira não foi localizado para comentar a decisão do Tribunal de Contas do estado de São Paulo.

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