Por Alan Brito

Educação

Municipalização do ensino fundamental
Entrevista com o professor José Benedito Prado, diretor do DECE (Departamento de Educação, Cultura e Esporte), de Taubaté

 

A briga em torno da municipalização do ensino de Taubaté está cada vez mais quente. Em entrevista exclusiva ao Jornal CONTATO, o diretor do DECE afirmou que não há volta no processo de municipalização. Prado fez pesadas críticas à postura da Apeoesp e de sua diretora (entrevista na edição 226 de CONTATO). Ele também salientou que a prefeitura possui um projeto pedagógico e que o estatuto do magistério já está sendo desenvolvido. Segundo o diretor do DECE, a redução do número de alunos do ensino fundamental da rede estadual foi causada pela política educacional que o Estado adotou na última década. Confira os melhores momentos da entrevista.


CONTATO: Há quanto tempo o senhor trabalha na área da educação?
Prado: Há 20 anos, estou na administração municipal há 13 e na direção do DECE desde maio de 2004.

CONTATO: Como está a situação do ensino municipal em Taubaté?
Prado: Está se reestruturando para atender algumas exigências legais. A cidade possui uma rede que oferece um ensino de qualidade. Estamos procurando aperfeiçoar o processo. No entanto, é normal que dentro do sistema exista uma falha ou outra. Mas, à medida que forem detectadas serão corrigidas.

CONTATO: O que o senhor achou da entrevista da diretora da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo), Solange de Castro?
Prado: Há algumas colocações que não são reais. Acredito que isso seja um desespero de causa porque a questão da municipalização é um assunto já resolvido. Não tem mais como voltar atrás. Por respeito ao dinheiro público, à população e à educação não há como não fazer a municipalização. Estamos buscando atender a comunidade e valorizar o professor da rede estadual. As colocações da Apeoesp têm sido um tanto quanto contraditórias e, na minha opinião, Solange fez algumas afirmações irresponsáveis.

CONTATO: Por que municipalizar o ensino?
Prado: A partir desta pergunta, eu entro na entrevista da profª Solange de Castro. A questão da municipalização está sendo muito discutida. E de repente me deparo com uma entrevista daquela, sem fundamentação teórica nenhuma que demonstra até uma certa irracionalidade e infantilidade. Quando nós começamos a trabalhar o processo de municipalização de seis escolas, fomos procurados pela Apeoesp e a cada momento eles apresentam [novos] argumentos. Na medida que nós respondemos e demonstramos que a análise feita por eles está errada e que, muitas vezes, a avaliação deles não está adequada à legislação que disciplina o assunto, eles mudam o enfoque das colocações. Mas sempre de forma muito vazia.

CONTATO: O sr. poderia dar um exemplo?
Prado: Para se ter uma idéia, quando começamos a tratar da municipalização, a Apeoesp marcou uma audiência no gabinete do prefeito e eu estive presente. Na época, eles alegavam que nós não estávamos trabalhando com educação infantil. Então, eu levei dados que comprovam que Taubaté é um dos municípios da região que tem maior oferta e atendimento de educação infantil. Os dados apresentados pela Apeoesp não eram reais. Em um segundo momento, a Apeoesp questionava que nós estávamos fazendo convênio com o Estado para a municipalização e que isso era uma atitude ilegal, pois qualquer convênio teria que passar pela câmara. Mas, o que fizemos foi um aditamento de convênio firmado em 2000. [Além disso] há um prazo de cinco anos para aditar esse convênio. A partir do momento que há aditamento de convênio não é preciso passar pela câmara.

CONTATO: O que ocasionou a fuga de alunos da rede estadual de ensino?
Prado: A professora Solange afirmou que há uma redução no número de alunos da rede estadual e um inchaço na municipal devido ao crescimento da rede municipal. Essa é uma visão muito reducionista. Na verdade, a causa não é só essa. A partir do momento que a prefeitura cumpre o que a legislação determina, ou seja, que o município tem que assumir o ensino fundamental e a educação infantil, a tendência é a rede estadual ir perdendo alunos do ensino fundamental. O Estado na década de 90 tinha salas superlotadas. A partir da nova Lei de Diretrizes de Base da Educação criou-se mecanismos para corrigir o fluxo de alunos, como a progressão continuada e a recuperação de verão. Isso fez com que diminuísse a grande demanda do Estado. O esvaziamento da escola estadual, [portanto], ocorreu por causa da própria política educacional adotada na última década.

CONTATO: Como o senhor avalia a opinião da diretora da Apeoesp sobre a questão do ensino municipal em Taubaté?
Prado: Solange não pode falar da situação do ensino municipal de Taubaté. Ela é minha colega de trabalho e a respeito por isso. Então, ela deveria pensar melhor antes de emitir determinadas opiniões. A prefeitura não transfere simplesmente os estudantes, esse é um pedido da comunidade. E quando a administração pública tem capacidade, ela assume. O questionamento deveria ser outro: Por que a população não quer colocar seus filhos na rede estadual?

CONTATO: A rede municipal está com salas superlotadas?
Prado: Eu gostaria que a Solange indicasse qual escola da rede municipal tem sala com mais de 50 alunos. Nós temos algumas áreas que chega até 46 estudantes, como Ezequiel e Santa Luzia. Mas, isso ocorre porque há pais que fazem questão de que seus filhos estudem nessas escolas. Essa colocação da diretora da Apeoesp não tem fundamento. Nossa intenção é reduzir o número de alunos por sala, como já está ocorrendo. Nós estávamos com um número muito grande de alunos entrando na 1º série e não tínhamos a mesma proporção de saída na 8º série. Automaticamente, isso causou um inchaço no meio do processo. Mas daqui a dois anos, nós teremos a mesma proporção de estudantes que entram e que saem. A rede ficará estabilizada e esse problema deixará de existir.

CONTATO: A diretora da Apeoesp disse que a administração municipal quer assumir os alunos do ensino fundamental da rede estadual apenas para receber o repasse do Fundef (Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental).
Prado: Isso é muito estranho. Durante o processo de municipalização, ninguém falou em recursos, nem o prefeito nem o Departamento de Educação. Quem bate nessa tecla é a Apeoesp. Nós não fizemos nenhum cálculo a respeito dessa verba. A prefeitura está com aditamento do convênio para assumir seis escolas da rede estadual. Essas escolas são aquelas que, a cada ano, está com um número menor de alunos. O Lopes Chaves, por exemplo, todo ano diminui o número de salas. Essa é uma situação que não tem mais o que se fazer. Essas escolas já estão ficando sem direção porque não há salas suficientes para comportar uma direção.

CONTATO: A prefeitura tem um projeto educacional?
Prado: Não sei o que Solange entende como projeto educacional. Nós temos um projeto. Tanto é que, do ponto de vista administrativo, a prefeitura tem recursos e está com licitação pronta para a construção de mais salas de aula. Nos bairros onde há maior demanda, nós poderíamos construir salas para receber esses alunos independente do prédio da escola estadual. Mas nosso planejamento administrativo e educacional faz enxergar o processo como um todo. Por isso, seria uma irracionalidade da administração investir em novas construções. Não faria sentido a prefeitura construir uma escola ao lado de uma outra do Estado que está ociosa. Isso é dinheiro público. Nós temos elementos que rebatem afirmações [de que não dispomos de um projeto educacional]. Na revista Ciências Humanas nº 2 da Universidade de Taubaté, há um artigo interessante que mostra o bom desempenho da rede municipal de ensino (ver Box).

CONTATO: A prefeitura pretende implantar o estatuto do magistério?
Prado: A rede de ensino de Taubaté é nova. É isso que Solange precisa enxergar. No entanto, nós estamos elaborando-o. A lei para criação do conselho municipal de educação já está na câmara. O plano de carreira e o estatuto do magistério também estão sendo elaborados. O prefeito precisa avaliar e encaminhar à câmara para aprovação. Só que como fazemos tudo de forma planejada, gostamos de analisar tudo que fazemos.

CONTATO: Em determinada parte da entrevista, a prof. Solange afirma que o senhor disse que está com dificuldades para fazer manutenção dos prédios municipais.
Prado: Não sei de onde ela tirou isso. Nunca fiz esse comentário. Nós estamos com nossos prédios muito bem administrados. Para os problemas que aparecem, estamos procurando soluções. Ela ainda fala em 6 salas, mas, na verdade, são 6 escolas. Esses prédios, a partir do próximo ano, estarão com salas de 1º a 8º séries. Nessas escolas, a merenda será terceirizada, com informática e tudo que a rede de ensino tem no seu quadro regular.

CONTATO: Como fica a situação dos professores da rede estadual?
Prado: Nesses últimos anos, os professores da rede estadual de Taubaté, principalmente os de 1º a 4º séries, enfrentaram graves problemas. Alguns até foram para outras cidades. Diante disso, a atual administração procurou fazer o aditamento do convênio para assumir a rede estadual e seus professores. É a primeira vez que isso é feito. Nós já estamos com 25 professores da rede estadual que assinaram o convênio e estão trabalhando na rede municipal.

CONTATO: Segundo a prof Solange, o professor não pode ser contratado e só recebe pela aula dada sem direito algum. Isso é verdade?
Prado: Não sei de onde ela tirou isso. Na rede municipal, o professor é registrado em carteira. Tem o professor estatutário, celetista concursado e celetista, que deve prestar concurso quando for aberto. Eles têm todos os direitos trabalhistas, fundo de garantia, férias, décimo terceiro, etc.

“Se de fato a Rede de Ensino Municipal de Taubaté apresenta bons resultados, isso também se deve à possibilidade de o professor ter uma certa autonomia na escolha de procedimentos mistos; pois, dessa forma, ele passa a comprometer-se efetivamente com o trabalho que realiza. O exercício de liberdade alia-se à responsabilidade de escolher o que lhe parece melhor, e de avaliar se tais procedimentos são, ou não, mais adequados.
Por fim, podemos finalmente concluir que tais professores não são apenas “executores”de propostas teóricas, mas partícipes das escolhas trilhadas por essa rede de ensino. Assim, favorecem a necessária integração entre teoria e pratica, entre o ideal e o real, solucionando problemas que se apresentam no processo de alfabetização, de acordo com suas crenças, experiências e anseios pessoais e profissionais. De fato, mais que professores, são brasileiros desejosos de um ensino público de qualidade.” (extraído do artigo A práxis docente na utilização de métodos no processo de alfabetização: construtivismo ou método fônico? Publicado na Revista Ciência Humanas, ano X vol. 10 n° 2, 2004, pg 148)

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