Por: Luiz Gonzaga Pinheiro

Eu me semeio

Eu me colho, digo com um pressenti- mento cinza, com medo dessa história que mal esboço e que já me conduz de-sandado e surpreso, mas com uma espe-rança azul..
Volto ao início e me vejo dividido em mil partes, em seguida milhões delas, só uma com a carga do infortúnio que, depois, chegou. Eu me semeio, volto ao mesmo ponto, como quem se automatiza, de tanto se repetir em ânsia de fazer encontrar o desejo com sua satisfação.
No silêncio das noites, madrugada, tento me achar em meio das fotos que de mim faço, como se não existisse e pre-cisasse me comprovar, atestando-me. As-sim, vou adiando a colheita, embora es-teja seguro do direito a ela. Afinal, a semeadura é de minha gestão, o desejo e a colheita de minha decisão de não me semear estéril.
Colherei sem pressa o que a semente me der. Só eu sei que esse plantar volátil, quase aéreo vai medrar. Por isso, passeio sobre mim mesmo, dando autoria ao su-cesso do plantio, uma certeza que só a mim pertence, como é só minha a colhei-ta, quando ela chegar. E chegará.
Mesmo agora, quando me semeio múltiplo de mim mesmo, me alegro
das sementes que, como pólem, vou deixando pelo caminho, mas sem o ins-tinto das gralhas, que não administram sua prole de futuro, esquecendo-se das áreas de fecundação, o que resulta no germinar de pinheiros, que não gosto de chamar por araucária, muito menos por seu adjetivo brasiliensis, que os de me-lhor Latim, entendem por do Brasil.
Ao contrário delas, sou atento à minha colheita, não me esquecendo de todo o ciclo das novas vidas, acompanhando o seu percurso para se multiplicar.
Eu me semeio de coragem e algumas idéias, nesse caso esperando que a colheita traga também alguma forma de reconhecimento, pois ainda não conheço escritor sem vaidade. Afirmo com o do-mínio que tenho de mim mesmo, só plantando ou semeando no varejo perifé-rico de uma humilde literatura de jornal.
Se deixar de me interessar pela semea-dura que em mim mesmo faço, levarei a decisão para o domínio sobrenatural, pois estarei fazendo um voto de abstinência contrário às minhas crenças e deveres. Nesse caso, passarei a semear a pílula do dia seguinte, toda vez que me contrariar com o resultado menor que o amor do plantio desejar, se um padre ou bispo de São José dos Campos tentar me conven-cer com suas idéias medievais.

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